O que esconde o movimento Escola sem Partido? |
Marcus Vinicius Batista
O movimento Escola sem Partido esconde as razões de seu nascimento ou, no mínimo, de sua ressurreição. Esta história começou em 2004 pelas mãos do advogado carioca Miguel Nagib e foi retomada a partir de 2014 por causa da polarização política no país.
Neste aspecto, brota a primeira inverdade. O movimento se diz a favor de neutralidade ideológica. Isso é impossível diante de duas palavras incompatíveis quando juntas. A inexistência de posição esconde uma posição. O grupo foi acolhido por uma parcela que enxerga a educação brasileira como um mundo bipolar. É um discurso antipetista e defensor de uma retórica alinhada com a extrema direita.
Um dos sinais disso é que Nagib procurou apoio político-partidário na família Bolsonaro, visando transformar suas ideias em projeto de lei. Primeiro, Flávio, deputado estadual no Rio de Janeiro. Depois, Carlos, vereador na capital daquele Estado.
Os diversos projetos de lei, principalmente os que tramitam no Congresso Nacional, tem como pano de fundo a Constituição. Mas o Escola sem Partido não apenas faz propostas redundantes quanto à Carta Magna, mas também a distorce. Um exemplo: a Constituição fala da educação como pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas. A proposta do movimento exclui a discussão sobre concepções pedagógicas.
Quando se aproxima a lente destas ideias, percebe-se que o movimento se agarra em preceitos moralistas cristãos sem o reconhecimento de que o faz. Há, por exemplo, uma carta de deveres para o professor que, segundo o projeto de lei do deputado Izalci Lucas (PSDB-DF), se constitui em seis obrigações. Na verdade, todas se resumem ao que NÃO se deve fazer. Entre os deveres, não defender partidos políticos em sala de aula. Até aí, tudo bem, mas o texto vem acrescido da proibição de incitar (termo pejorativo) a participação de estudantes em manifestações, passeatas e atos públicos. A domesticação com um sorriso educado, é isso?
O projeto de lei retorce ainda a Constituição ao cortar a "liberdade de ensinar" para manter somente a "liberdade de aprender." É o atraso pedagógico, em qualquer concepção contemporânea, que descarta o diálogo, que considera o aluno como caixa vazia e o professor como detentor exclusivo do saber. Como acreditar nessa sandice em tempos de Internet e redes sociais?
A Internet, aliás, é o principal instrumento de propaganda do movimento. Qualquer iniciante sabe que, numa guerra ideológica, a propaganda é arma fundamental. Corações e mentes, amor pelo próximo, ódio pelo diferente.
O site do Escola sem partido repete várias vezes os termos clichês contra a esquerda e possui uma seção chamada Síndrome de Estocolmo, como se professores fossem sequestradores intelectuais. Só estes conteúdos já indicam a morte do próprio nome - Escola sem Partido -, que convenhamos é uma escolha eficiente, é claro, para o marketing político, não para a realidade das escolas brasileiras.
O presidente do movimento, Miguel Nagib, afirmou, em programa no Canal Futura, que o professor não deve ter liberdade de expressão, o que contradiz a própria essência do discurso dele, que se defende alegando que não há liberdade de expressão na escola e que os professores idolatram um único partido. No caso, o PT.
É difícil entender o discurso quase patológico, se não fosse mal intencionado. Como acreditar que todos os professores brasileiros são de esquerda? Mais do que isso, que defendem um partido único? É desconhecer a realidade escolar, abusando do estereótipo do professor de História que dá aula vestindo a camiseta do Che Guevara.
O Escola sem Partido argumenta que os professores brasileiros não recebem formação jurídica e ética sobre a própria profissão. Aí falta conhecimento. Os cursos de licenciatura, via de regra, possuem disciplinas como Políticas Públicas e/ou trabalham Ética como se recomenda, de maneira transversal.
O movimento Escola sem Partido representa, acima de tudo, uma desonestidade intelectual. É a construção de uma estratégia para se apropriar, com ideologia sim, dos processos educacionais, conduzindo a escola para um caminho sem reflexão, sem análise, sem senso crítico.
O que mais interessa à Escola sem Partido não é a diversidade ou a pluralidade de pensamento. Assim como muitos ismos de esquerda e de direita na História, o Escola sem Partido deseja e sonha com a ditadura do pensamento único. E escolheu os professores como bucha de canhão para alvo com bolinha vermelha na testa.
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