domingo, 30 de março de 2014

31 de março




Os 50 anos do Golpe de 1964, a serem lembrados em 31 de março, rasgaram cicatrizes e fizeram com que antigas feridas voltassem a sangrar. Junto com o sangue coagulado e encoberto por ataduras políticas, renasceram distorções em torno da tagarelice eleitoral e de valores tão obsoletos quanto os militares no poder.

Com a proximidade da data, é preciso tirar a poeira de certos aspectos que não devem ser vistos como notas de rodapé, mas como pontos importantes de um período desagradável da História brasileira.

Os 50 anos do golpe devem ser lembrados, e não comemorados, como grita uma minoria da classe política, representada em palanques – eventualmente – por bravatas de polemistas com mandato. Comemorar significa celebrar, enaltecer, valorizar. A lembrança nos aponta outra direção, o caminho do aprendizado, que visa evitar a repetição de erros, sejam políticos, econômicos ou sociais.

A segunda correção envolve a nomenclatura. O que houve em 31 de março de 1964 foi um golpe, e não uma revolução. As palavras carregam peso histórico, e este lastro não deve passar por maquiagens. Os militares tomaram o poder à força, rasgando as regras democráticas diante de uma paranoia artificial de que o Brasil se tornaria uma nação comunista.

Futurologia nunca foi um argumento consistente, ainda mais quando impregnada de propaganda política. O Brasil era um jogador dentro de uma partida com dois times em guerra fria.

Em 1964, não aconteceu uma revolução. O sistema político se manteve em essência. O modelo econômico sofreu poucas alterações. Revolução implica em ruptura radical. Os peões trocaram de lugar, mas o tabuleiro permaneceu o mesmo.

A aproximação dos 50 anos do Golpe teria ressuscitado uma direita organizada, sedenta pela volta dos militares ao poder. Comentários de balcão de padaria e blefes de ativistas de Internet não significam que as ruas ficarão lotadas de manifestantes ávidos por mudanças políticas. Basta o fracasso da marcha da família publicidade de margarina.

A direita nunca morreu. Ela, de fato, encolheu e entendeu que, até ontem, inclusive por conta da própria ditadura, pegava mal se assumir como direitista. Na prática, tenho dúvidas se existem, no Brasil atual, direita e esquerda, salvo as exceções extremas e nada representativas.

A política se ajoelhou diante da economia. Partidos de origens distintas incineraram o próprio passado para beber do poder. Políticos pulam de um lado a outro do muro como se fossem crianças que brincam de polícia e ladrão, ora invertendo papéis. Aliás, o muro caiu no século passado e levou com ele as diferenças ideológicas.

Hoje, todos navegam no centro, agarrados como náufragos nas alianças eleitorais. Vermelhos, verdes, azuis, todos os partidos vestem uma só cor, numa única direção. E assassinaram os velhos conceitos de direita e esquerda, irmãs com esqueletos ditatoriais nos armários.

Engana-se quem pensa que o país atravessa uma onda de neoconservadorismo. Na verdade, é o velho conservadorismo de sempre. Só que, desta vez, encontrou um banquinho na praça, dentro de redes sociais, para esbravejar, bater o pé e fazer birra.

Por ironia, a democracia é o que dá liberdade para as manifestações de todas as ordens. Até para os protestos que pedem ações autoritárias. Até para quem nunca entendeu o que é uma ditadura. São os analfabetos políticos, incapazes de traduzir as letras da História. Ainda bem que, depois de 31 de março, vem 1º de abril.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Um pedaço de museu


Com a aproximação da Copa do Mundo, o patriotismo brasileiro, centrado nos esportes e – eventualmente – na cultura, se sobressai como regra, o que implica na necessidade do culto aos clichês. Expressões como “melhor futebol do mundo”, “pátria de chuteiras”, “time de guerreiros”, “200 milhões de corações na ponta da chuteira” viram mantras para parte da mídia, interessada – é claro – nos dividendos comerciais da competição.

De carona, a classe política se aproveita da conjuntura favorável para torrar dinheiro em propaganda e adaptar o discurso do “ame-o ou deixe-o”. Em Santos, descontando as expectativas de casa cheia – e de lucros exorbitantes - por conta das seleções do México e da Costa Rica, a promessa de gol de placa é o Museu Pelé. O lugar virou o camisa 10 – com o perdão do trocadilho - de mais uma onda de progresso vestido de especulação.

O Museu Pelé é, de fato, um símbolo desta época de Copa do Mundo. Simboliza como o comportamento da classe política se repete em blefes, independentemente de qual seleção partidária os jogadores defendem por baixo dos ternos e das gravatas.

A estratégia de jogo é sempre sujeita a adaptações, ainda que as mudanças sejam de improviso. A palavra planejamento, por exemplo, não aparece no vocabulário. As obras do Museu Pelé estão atrasadas dois anos. O custo dobrou: de R$ 20 milhões para R$ 40 milhões. O anúncio aconteceu em 2007, mesmo ano em que o Brasil foi escolhido como sede.

Além disso, o museu não será inaugurado completo. Quando assumiu a Prefeitura, Paulo Alexandre Barbosa disse que a obra estaria pronta antes da Copa. O discurso foi reforçado até janeiro deste ano, minimizando as dúvidas colocadas pelos jornalistas.

Na semana passada, o secretário municipal de Turismo, Luiz Dias Guimarães, afirmou que o Museu Pelé não abriria as portas com todos os setores concluídos. Em outras palavras, o museu será inaugurado por volta de 9 de junho, com maquiagem definitiva ou de oportunidade. Até agora, a Prefeitura não bateu o martelo sobre quando cortará a fita.

A questão não é somente política. É matemática. Quando faltavam 104 dias para a abertura da Copa, o Diário Oficial de Santos publicou o cronograma de serviços do museu. A Eletrowal teria 120 dias para implantar a entrada de energia. A Viabiliza Engenharia e Construções, 100 dias para instalar pisos, tampos e bancadas de granito. Já a P.D da Silva Rocha, 90 dias para instalar os pisos de mármore. E a HJI Instalações, também 90 dias para colocar o forro metálico. Diante do histórico de atrasos, basta fazer as contas.

O acervo, que precisa ser organizado conforme normas museológicas, engrossa a lista de dificuldades. Fora a organização das peças, viabilizar o museu é um processo que implica também na contratação e capacitação de pessoas, envolvendo toda a hierarquia, mais projetos paralelos de fundo educacional.

Nos intervalos da obra, as promessas em campo. O secretário estadual de Turismo, Claudio Valverde, prevê que o Museu será o ponto mais visitado do Estado de São Paulo, superando o Zoológico da Capital. É como chutar quem será o campeão da Copa, em 13 de julho.

O Museu Pelé vai entrar no ritmo carnavalesco que contamina a Copa do Mundo. A tática é previsível. Festa, sorrisos, juras de amor à pátria, políticos em torno do rei (se ele aparecer!). Pagaremos a conta após o apito final, por um espaço que precisará de reparos tão logo nasça para o público. Um golaço, só que contra.

terça-feira, 11 de março de 2014

As tendências do telejornalismo regional




Em 22 de novembro de 2002, participei de um encontro com jornalistas de todo o interior do Estado. O evento, organizado pelo Sindicato dos Jornalistas, tinha como objetivo debater a situação do telejornalismo nas emissoras afiliadas e retransmissoras. Na ocasião, era chefe de reportagem e editor de texto na afiliada da Rede Record, em Santos. Escrevi um texto para aquela conversa, que localizei quando revirava um baú há uma semana. Ao reler, percebi que parte dos argumentos (e das dúvidas) são atuais. Fiz alterações mínimas para preservar a reflexão original. 

+++++++++++++++++++++++++++++++

Ao ser convidado para debater, com colegas de todo o Estado, sobre as tendências do telejornalismo regional, fiquei preocupado com dois caminhos que são tentadores, mas que também podem desfocar o que – para mim – é a real intenção desse encontro.

O primeiro deles, não necessariamente na ordem de importância, é regionalizar demais a conversa (o que deve acontecer em alguns momentos, porém somente para simplificação). Se ficarmos presos ao universo da Baixada Santista, poderíamos frustrar expectativas e, acima de tudo, colocar sob os holofotes características próprias do telejornalismo produzido aqui, que não correspondem a outras praças produtoras e consumidoras de informação jornalística em São Paulo.

A segunda tentação seria esbarrar em profecias, exercícios de futurologia, diante do processo no qual se encontra o jornalismo atual. É pouco provável que alguém seja capaz de acertar na mosca quando se fala dos rumos a serem tomados pelas práticas jornalísticas e, principalmente, pelo ofício de jornalista.

Por isso, creio que a proposta mais relevante desse encontro – e acredito que seja esse o pensamento dos organizadores é discutir conceitos e como eles interferem no dia-a-dia do jornalismo regional. Quero deixar claro que não pretendo dar respostas. Tenho a intenção de confrontar ideias.

Além dos conceitos do fazer jornalístico cotidiano, precisamos relacionar a produção regional, local, com itens como velocidade, novas tecnologias, o grande número de fontes produtoras e distribuidoras de informação, crise ética da nossa categoria e, inclusive, excesso de dados como causa de desinformação.

O telejornalismo regional, no caso da Baixada Santista, pode ser considerado novo. Os telejornais mais antigos têm cerca de 20 anos (trecho atualizado, caro leitor). Se levarmos em consideração o tempo de vida de telejornais nacionais, ficamos ainda mais novos. E se levarmos em conta o mais tradicional veículo de comunicação da Baixada, o jornal A Tribuna, as TVs são bebês. E por serem bebês, são mais suscetíveis às mudanças de personalidade.

O advento dos telejornais regionais mudou completamente o mapa midiático da Baixada Santista. Além da evidente abertura do mercado de trabalho, que inclui o outro lado do balcão, os telejornais alteraram o comportamento das fontes, ampliaram a visão do públicos sobre as autoridades constituídas e modificaram muitas vezes a pauta política, econômica e social da região.

Não podemos esquecer o tamanho da responsabilidade, já que no Brasil 97% das pessoas se informam pela televisão. (O número é da Pesquisa Brasileira de Mídia 2014). E penso que aqui ou em outras áreas do Estado de São Paulo não é diferente.

No entanto, durante o processo de produção de um telejornal, muitas vezes eu me pergunto: o material que vai ao ar apresenta afinidade com o telespectador? As reportagens reforçam uma identidade regional? Para quem estamos falando?

Para retratar a identidade cultural de uma área, é preciso que o veículo de comunicação tenha uma identidade. Será que temos? Estamos em formação. Estamos incluídos num processo de mudança que afeta toda a prática jornalística.

Internet, jornalismo online, espetacularização da notícia, crise ética, formação dos jornalistas; são incêndios que deixam também chamuscados os jornalistas das praças mais afastadas dos grandes centros. Como lidar com isso sem perder o foco sobre o microcosmo que estamos inseridos? Francamente não sei.

Por este motivo, o debate é sempre interessante. Sair do sistema produtivo, olhando-o de fora e discutindo-o como objeto de estudo é para mim cada vez mais instigante.

De qualquer maneira, creio que é questão fundamental buscarmos um caminho próprio. À base de critérios elucidativos e tecnicamente profundos, os telejornais regionais devem estabelecer projetos editoriais próprios, que não dependam das grandes redes. Não devemos esquecê-las e tampouco ignorá-las, pois sabemos que em muitas ocasiões as medidas vêm de cima. As redes também são vitrines, pontos de visibilidade para a produção local.

No caso da tecnologia, precisamos ser tão rápidos, tão alucinados? É evidente que, em termos de jornalismo diário, a velocidade faz a diferença. Questiono a necessidade alucinógena de seguir à risca o conceito de tempo real. Tive um chefe – já falecido – que dizia: é melhor dar a notícia um pouco depois, com mais profundidade e qualidade do que divulgar de forma afobada e superficial.

A notícia fragmentada desinforma o público, quebra a essência do que considero jornalismo. Para que saber de parte da história agora se podemos tê-la por completo daqui a pouco? Por que os telejornais não podem tomar uma estrada diferente do senso comum?

Em parte, isso é feito. No telejornalismo regional, eventualmente há espaço para análise, para reflexão. Contudo, essa situação acontece numa linguagem diferenciada, em que imagem é secundária.

O que quero discutir é porque temos dificuldades em aplicar isso no formato convencional de telejornal. Tempo? Estrutura? Talvez. Aliás, quebrar o formato convencional – pelo menos numa fatia – seria também uma forma de regionalizar o processamento da informação.

O telejornalismo regional tem que pedir a carta de alforria à estética e à ditadura da linguagem. Por que não estética e linguagem próprias? Não estou propondo que queimemos tudo e iniciemos de novo. É evidente que os telejornais, quando nasceram, tinham que adotar um ponto de referência. E esse ponto foram os telejornais nacionais que, por sua vez, tomaram como influência a linguagem e estética jornalística norte-americana. Acredito que está na hora de andarmos com as próprias pernas e muitos já o fazem.

Adaptar é o que nos torna diferenciados, torna-nos regionais, aproxima-nos do público. Os telejornais regionais possuem essa enorme vantagem: o contato direto com as pessoas, sabendo de suas dificuldades, de seus desejos, de seu universo. A proximidade nos concede mais facilidades para que nós, jornalistas, possamos expor conceitos que socialmente são relevantes como cidadania, ética, alfabetismo políticos e relações sociais.

Os telejornais regionais – e posso dizer isso pelo que vejo na Baixada Santista – tentam seguir este caminho, muitas vezes de forma inconsciente, anárquica e, por isso, se surpreendem – dependendo do caso – com os resultados obtidos. Temos que enxerga à frente uma única meta: mostrar a face de quem estamos falando, com a definição clara para quem estamos falando.

Em outras palavras, dar ao telespectador a sensação inquestionável de identificação com seu bairro, cidade e região. Isso envolve também seus valores, cultura, modo de ver o mundo. É o maior desafio para os telejornais na atualidade.

Quero concluir com uma ideia exposta pela jornalista Neide Duarte. Ela deu uma entrevista para a revista Imprensa e, no meio da conversa, disse o seguinte: “Eu não acredito nesta história de que uma imagem vale mais do que mil palavras. É justamente a palavra que faz a diferença. Este tipo de texto pode ser usado em qualquer matéria, por menor que seja. Tem que buscar a palavra exata, a melhor palavra. E mais que isso: a palavra que revele a imagem. Que dê a imagem um novo sentido.”

Trazendo para o nosso cenário, quem não seja o caminho para o telejornal regional? Estimular a reportagem, no sentido de fortalecer a identidade local, fazer o telejornal a imagem e a semelhança de seu público, de sua cidade. Dar um novo sentido para a linguagem televisiva.

sábado, 8 de março de 2014

Carta aos machos


Dia Internacional da Mulher em Melbourne, Austrália.
Ano de 1975. O que mudou, na visão dos machos?

Aos deuses da virilidade,

Neste sábado, dia 8 de março, não é Dia Internacional da Mulher. Finjam que desconhecem a data e não tentem encenar em um dia o que são incapazes de praticar no resto do ano. Como primeiro passo, é melhor assumir que vocês não acreditam nos discursos desgastados de morte do sexo frágil, de sensibilidade para a vida, de igualdade no mercado de trabalho, entre outros clichês que se reproduzem nesta época.

Compreendam, no cotidiano, que uma mulher – quando conversa com vocês – talvez deseje somente isso: conversar. Quem sabe construir uma amizade ou um bom relacionamento no ambiente de trabalho, na universidade, na vizinhança? Uma mulher, quando inicia um diálogo, não está pensando necessariamente em sexo ou em flertar com vocês.

Neste sentido, entendam também que, quando uma mulher se veste de maneira mais sensual ou com roupas mais curtas, ela não é uma vadia. As roupas mais curtas, seja uma minissaia, seja um decote, não trazem uma placa com o texto: “Por favor, me estuprem!”!

Mulheres não são propriedades ou objetos de consumo, muito menos dentro da família. Pais, avôs, tios, irmãos e primos, parentesco não é salvo conduto para violentar as mulheres de sua casa. Vocês deveriam ter superado esse comportamento selvagem. A bestialidade deveria ter ficado na época das batalhas com cavalos e espadas, quando nossos ancestrais se vestiam com peles de animais.

Na vida profissional, suas colegas costumam ser competentes e, quando são promovidas, é bem provável que a mudança aconteceu por merecimento. Suas colegas de trabalho não tiveram relações sexuais com os chefes ou se tornaram amantes deles. Talvez vocês não tenham sido promovidos porque o desempenho delas é melhor. Elas estudaram mais e se dedicaram mais ao trabalho.

Dentro de casa, vocês tem parceiras, e não escravas, até porque dona de casa é cargo sem remuneração. Por que, nos restaurantes, vocês respeitam os chefs de cozinha, mas em casa o fogão tem nome feminino? Lavar a louça, arrumar a cama ou trocar fraldas são funções humanas, sem determinação por gênero. Ou desconheço alguma legislação que estabelece a mulher como dona exclusiva destas áreas?

Se as mulheres ganham mais do que vocês, por que resolvem acabar com o casamento? Não é um contrato de sociedade conjugal? Então, ambos têm responsabilidades. Um parceiro ter maior salário do que o outro é circunstancial e nada definitivo. Vocês não são provedores. Vocês dividem o espaço e a vida com alguém, na intimidade.

Vocês podem argumentar que muitas mulheres compartilham de suas opiniões. Elas acham que mulheres de roupa curta são vadias e deram para os chefes na empresa, além de vibrar com a nova máquina de lavar e viver às custas de vocês.

Quando ouvem tais sandices, vocês enchem o peito e falam com orgulho: “sou o homem da casa.” Existem mulheres machistas. Elas podem ser as piores porque repetem a estupidez humana sem ter consciência disso.

Como são previsíveis, vocês pretendem presentear as mulheres com flores, café da manhã na cama, caixa de bombons e outros mimos para amenizar suas culpas. Sejam honestos com vocês mesmos e, principalmente, com elas. Peçam que elas os perdoem e encarem o restante dos dias como uma repetição contínua de 8 de março. È melhor do que encenar datas.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Curtir, comentar e compartilhar votos




A eleição deste ano será a primeira em que a Internet – principalmente as redes sociais – pode ter um papel de protagonismo nos rumos das campanhas. As redes sociais apareceram como coadjuvantes nos dois últimos pleitos, em 2010 e em 2012, mais pela cobertura da imprensa e pela procura por informações dos eleitores na contagem dos votos. 

No caso dos candidatos, apenas os cachorros maiores entenderam que deveriam profissionalizar a relação com os eleitores, mas alguns se limitaram a criar perfis profissionais.

A lição de que as redes sociais são essenciais para o processo político veio da equipe de Barack Obama, em 2008. Ali, ficou cristalina a necessidade de produzir informações e criar mecanismos de aproximação com o eleitor no mundo virtual. A estratégia incluía respostas rápidas para reações do público e para conteúdos desfavoráveis na imprensa, independentemente da mídia.

Desde o ano passado, os políticos da Baixada Santista dão sinais de que começaram a entender as mudanças. Muitos secretários e vereadores, em Santos, dialogam diretamente com outros usuários de Facebook. O secretário de Cultura, Raul Christiano, por exemplo, possui cinco perfis.

A Câmara Municipal de Santos criou um sistema de chat para as audiências públicas, que permite a participação do público sem estar presente no local. As audiências são transmitidas desde abril do ano passado pelo canal de TV a cabo do Poder Legislativo.

Em Cubatão, secretários municipais se revezam – desde janeiro – no atendimento ao público via rede social. É o chamado Gabinete Virtual, espécie de plantão de atendimento no Facebook. A prefeita Márcia Rosa e o secretariado participam, desde o início de fevereiro, de uma reunião semanal na qual qualquer cidadão pode participar, com inscrições por e-mail. Os encontros acontecem às segundas-feiras, às 8 horas, na Prefeitura.

O problema é que, quando nos afastamos de cidades grandes ou médias, torna-se latente a baixa percepção dos políticos sobre comunicação online. O publicitário Thiago Peres Teves produziu, no ano passado, um estudo sobre o papel das redes sociais entre os vereadores de Mongaguá. Os resultados assustaram. Dos 13 vereadores, somente quatro divulgam os trabalhos legislativos pelo Facebook. Deles, um possui página oficial como vereador.

Todos os parlamentares de Mongaguá possuem perfis pessoais na rede social, mas predominam as fotos de família e comentários genéricos sobre festas, almoços e outros tipos de eventos.

Mais do que um avanço, conversar ou abrir canais para os eleitores é uma questão de sobrevivência. Diante de uma imagem tão desgastada, a classe política teve que migrar para o mundo virtual a fim de reconstruir uma relação com o público.

No entanto, as redes sociais não são vistas pela classe política como um instrumento de cidadania. Os conteúdos indicam, acima de tudo, propaganda camuflada, geralmente livre da legislação eleitoral.

No mundo online, a campanha eleitoral corre na quinta marcha. Mesmo oficialmente pré-candidatos, muitos concorrentes já contam com um exército de colaboradores que mobilizam seus perfis para enaltecer os empregadores ou atacar os adversários. A remuneração pode se estender aos blogs, com empresas estatais como anunciantes.

A produção de informação está além de multiplicar links ou agir como máquinas de curtir mensagens. Diariamente, nascem postagens falsas – em forma de cartazes ou de reportagens – que visam desmoralizar o partido inimigo. O esgoto eleitoral fica mais evidente entre os peixes grandes, que realimentam a política como um Fla-Flu, cenário resumido a petistas e tucanos.

De fato, os irmãos são quase gêmeos. São como Caim e Abel, dentro e fora da Internet. Nas palavras, nos atos e nas ilusões.