sexta-feira, 31 de agosto de 2012

A obra é só do Beto?


Numa campanha eleitoral previsível e tediosa, o maior fenômeno da corrida à Prefeitura de Santos é o perfil no Facebook chamado “Obra do Beto”. O perfil é uma versão humorística dos cavaletes espalhados pela equipe do candidato do PP. Na versão virtual, Beto Mansur é responsabilizado pela construção das sete maravilhas do mundo, por ter cedido o jatinho a Neymar, pela criação do pastel de carne, da sexta-feira e da Teoria da Relatividade, entre outras fantasias. Quase nove mil pessoas já comentaram sobre este assunto. Quase três mil seguem a página no Facebook.

Beto Mansur disse à imprensa que gostou do tom bem humorado. Mas que sua equipe de campanha estaria monitorando abusos. No velho estilo “bem ou mal, mas falem de mim”, o candidato adotou, de fato, uma reação esperada. Brigar com o humor em política significa, além de assinar embaixo nas contestações, aumentar o poder de fogo do riso e do escárnio.

O candidato do PP tem evitado conflitos. Mesmo quando provocado em debates, adota o tom explicativo e conciliatório. Até porque as pesquisas indicam uma tendência de aproximação da candidatura de Telma de Souza, atual segunda colocada.

Mas o fator principal é que Mansur possui o maior índice de rejeição entre os nove concorrentes. Em média, 40% dos entrevistados jamais votariam nele, índice que coloca em dúvida as chances de alcançar o segundo turno.

O perfil “Obra do Beto”, mais do que provocar o candidato do PP, nos mostra dois pontos importantes nesta campanha eleitoral. O primeiro é a presença do humor. Rir dos políticos nos torna mais saudáveis para acompanhar os absurdos que prometem e fazem, ainda mais expostos gratuitamente no rádio e na TV.

O humor também alcança degraus de crítica que outras linguagens – o jornalismo, por exemplo – não conseguem ou não desejam atingir. O humor cultiva a capacidade de rirmos de nós mesmos, cientes de que os delírios da classe política encontram abrigo e legitimidade em boa parcela do eleitor, suposta e equivocadamente visto como ingênuo ou bondoso por princípios.

Na campanha presidencial, dois anos atrás, houve uma tentativa de silenciar a turma do humor. O tiro desnudou a faceta autoritária de alguns candidatos, que se agarram na onda do politicamente correto. Esta onda, com o sorriso amarelo de turma do bem, patrulha, persegue e condena como inquisidores aqueles que pensam e agem fora do padrão.

O segundo fator é que o perfil “Obra do Beto” não se restringe a Beto Mansur. Ele apenas exercitou, de maneira mais escandalosa, uma prática comum aos políticos. Candidatos, cedo ou tarde, cedem à tentação do personalismo. Abandonam suas siglas, se esquecem por conveniência de suas equipes, e adotam o discurso do “eu absoluto”. Eu fiz. Eu construi. Eu pensei.

A megalomania é característica marcante dos narcisistas. E políticos são narcísicos por natureza. Adoram uma plateia. Têm orgasmos políticos com os holofotes. São viciados em bajuladores a sua volta. Em um dos debates na TV, o candidato do PSDB, Paulo Alexandre Barbosa, usou tantas vezes a palavra “eu”, que outro candidato – que não é exceção – advertiu o colega pelo comportamento egocêntrico.

O perfil “Obra do Beto” acrescenta molho a uma campanha sem tempero, na qual ninguém se arrisca, na qual todos falam sobre os mesmos assuntos do mesmo jeito. A festa de frases feitas e gestos devidamente calculados nos aponta que, no fundo, todos desejam ser os pais da criança. Beto Mansur apenas pediu primeiro para fazer o teste de DNA. 

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

E o vento levou ...



Eles estavam desaparecidos há quase quatro anos. Sumiram das ruas.  Jurei tê-los enterrado nos cafundós da minha memória. Minha ilusão se alimentava de uma ideia: nunca mais os veria. Até porque ninguém mais falava sobre eles. Mortos por indiferença.

De dois meses para cá, resolveram nos visitar novamente, como aquele parente indesejado que toca a campainha tarde da noite, numa visitinha sem avisar, coloca os pés no sofá e diz estar com fome. Eles voltaram! Não abrem a boca, mas a presença delas suja o ambiente. Como são da mesma família, mancham a visão pela semelhança física. Logo, não adianta fugir deles. Sempre haverá um membro do clã a te olhar na próxima esquina. 

Embora parentes, eles estão poucas vezes juntos. Uma das marcas da família é a competitividade. Disputam o mesmo pedaço de chão; às vezes, com estratégias nada louváveis, o que inclui até sabotagens nas madrugadas. Aliás, todos – por lei – precisam voltar para casa às 22 horas, sob risco de multa em dinheiro. Dinheiro, um combustível importante para justificar a resistência física desta gente.  

Eles são madrugadores. Acreditam piamente no ditado da ajuda divina para quem cedo madruga. Seis horas da manhã, inclusive na frente da igreja. Até outubro, levantar com as galinhas é ritual para quem sonha em se destacar nesta família de iguais.

Nossos “amigos” preferem se espalhar pelas esquinas para demarcar um território maior – e quem sabe? – grudar nas mentes distraídas como música-chiclete de rádio FM. Destacam-se – como grupo – na multidão. Fingem simpatia, com a marca do sorriso amarelo. Sempre têm uma palavra acolhedora, de garantia de futuro melhor. Saem bem na foto.  

Eles costumam escolher frases feitas, simplistas até. É a receita básica da propaganda. Ser narcisista, encenar solidariedade e jamais explicar suas intenções. Confundir quem dá atenção a eles, tomando para si desejos e angústias de quem cometeu o pecado de ouvi-los por alguns segundos.

Quando passo por eles, percebo que escolhem os assuntos de sempre. Banalizam termos como ética, família, educação e saúde. Quando provocam muita desconfiança, insistem em redesenhar o passado. Reconstroem a memória com glórias e honras, chamando para si todos os sucessos – ainda que muitos não pertençam a eles – e exorcizam os fracassos e escorregões morais como um religioso diante do mal personificado.

Esta semana, eles não passaram impunes pelas ruas da cidade. Sofreram diversos ataques de “terroristas” silenciosos, precisos como um cirurgião, porta-vozes de grupos incomodados com a desfaçatez.

Numa destas tardes, mais de uma dezena deles jazia nas calçadas da Avenida Conselheiro Nébias. Solenemente ignorados, estrebucharam por horas, estirados como o moribundo à espera de socorro. O vento, talvez pelas preces coletivas, os mantinha em posição horizontal, rejuvenescendo a imagem da cidade.

À noite, outros apareceram afogados no canal 4. Os autores do “crime” não foram localizados. Nenhum grupo assumiu a autoria da caridade. Na orla da praia, ciclistas os transformaram em bolas de futebol. Os chutes fizeram com que os visitantes repousassem nos gramados. Nenhum juiz teve a coragem de marcar falta. Só não apareceram os humoristas que, há quatro anos, redesenhavam a maquiagem que realça o sorriso circense.

As reações anônimas ou climáticas me lembram de contar os dias para que estes intrusos deixem a cidade em paz. Tenho certeza – promessa de campanha – que os cavaletes tomarão o caminho da roça em outubro. Ainda assim, rezo para que venham novos sopros do fiscal eleitoral lá em cima.
 

terça-feira, 21 de agosto de 2012

A plantação de Tiriricas


Precisava expurgar meus pecados. Poderia ter ido à igreja ou visitado um sacerdote. Mas por preguiça – sempre um herege! – preferi limpar minha alma em casa mesmo. Liguei a TV para assistir ao primeiro dia do horário eleitoral gratuito. Ali, imaginei que veria gente bem pior do eu, o que confortaria minha consciência no purgatório e aumentaria minhas chances de tomar o elevador para cima.

Sarcasmo à parte, assisti por obrigação e curiosidade profissional. O horário eleitoral, cuja gratuidade é uma aberração jurídica, segue supervalorizado como se fosse a solução para as campanhas mal conduzidas ou a ratificação daqueles que se julgam eleitos. As pesquisas apontam que quase 60% dos eleitores não se interessam pela hora diária de blábláblá no rádio e na TV.

A estreia envolveu os candidatos a vereador. Seria engraçado se não fosse deprimente, quase um AVC. Se não fosse uma repetição das velhas estratégias que esgarçam a imagem do processo eleitoral, que transformam a política num exercício de cinismo, superficialismo nos argumentos e oportunismo individual.

O horário eleitoral mostrou o que se esperava dele. Em linhas gerais, os candidatos distorcem ou desconhecem os papeis de um vereador. Prometem obras e programas públicos que são funções do Poder Executivo. Jamais falam em legislação ou em fiscalizar as ações do prefeito.

Como discurso, os candidatos – em sua maioria esmagadora – misturam e esvaziam palavras da moda como confiança, família, ética e trabalho. Jogam todas em um liquidificador e vomitam um palavrório acelerado (o tempo é de alguns segundos para cada um) de boas intenções, porém vazias de consistência para o debate público.

Os candidatos de primeira viagem reforçam a retórica da renovação, sem explicar porque representam a novidade. Aqueles que estiveram na Câmara ou que pretendem permanecer por mais quatro anos utilizam a tática do balanço. Falam em quantidade de trabalhos, lista que inclui requerimentos, pedidos de poda de árvores, títulos de cidadão e outros pormenores cotidianos do toma-lá-dá-cá da função.

É óbvio que aparecem os candidatos que tentam se aproveitar da fama em outras áreas. Tem o cantor de pagode e o ex-jogador de futebol, que acreditam que seus próprios nomes bastam para se tornarem vereadores. O discurso é como um samba que desafina na nota ou como um gol perdido na pequena área, tamanho o vácuo de conteúdo.

O elenco do circo de horrores se completa com os candidatos que lutam para se destacar na multidão. Na minha cidade, Santos, são mais de 450 pessoas na briga por 21 vagas, proporção digna de vestibular de universidade pública. Como estratégia rasteira, apelam para um slogan de rimas pobres. Um deles rimou o “al” de seu nome para nos livrar do mal. Uau!

No desespero para atrair os holofotes em poucos segundos, arroubos criativos como abraçar a própria mãe, colocar um sujeito ao lado para apontar e dizer “É o cara”, ou fazer movimentos a la Karatê Kid para afirmar que luta por nós.

Mas a cereja do bolo são os candidatos que escondem suas identidades — seria vergonha ou falta dela? — atrás de fantasias. Por aqui, apareceu um sujeito vestido de Jack Sparrow. Falava em espanhol. E terminava com a rima paupérrima: “Chega de mamata! Vote no pirata!”.

Juro que me esforcei para achar engraçado. A eleição é séria demais e, por isso, merece humor. Mas não dos candidatos. Deixem para os humoristas, que fiscalizam os palhaços da vez. Se a estratégia do navegante clone de Jonhny Deep vai naufragar ou não, depende do grau de tolice do eleitor. Até porque todo colégio eleitoral tem o Tiririca que merece!

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

O tabu do crack


Eduardo (nome fictício) estava magro demais. Um fiapo humano, só com a roupa do corpo. Morava, há um ano, na rua por conta do vício, que tentara largar duas vezes. Não trabalhava desde então e, quando tentava emplacar algum bico, perdia a vaga pela ausência de documentos. Deixara sua identidade e outros papéis nas mãos de um traficante como parte do pagamento de uma dívida de pedras.

Eduardo, que reencontrara a família depois de adulto, quando emigrou do Nordeste, entendeu duas coisas. A primeira era que não tinha mais como afundar na vida. Virara um indigente. A segunda era que precisava procurar ajuda. Engoliu o que sobrou de orgulho e procurou parentes próximos.

A história de Eduardo, aqui contada de modo a preservar a identidade dele e de seus familiares, se multiplica embaixo das marquises e em praças de Santos. Não é preciso procurar muito para encontrar grupos se abrigando na porta de lojas e residências na Vila Mathias, Marapé, Aparecida, Embaré, Encruzilhada e Gonzaga, apenas para mencionar alguns bairros por onde caminhei esta semana.

O crack se tornou epidemia nacional, mas ainda é visto como um problema jurídico ou de segurança pública. É um olhar necessário, mas que não pode ser visto como único, que descarta quaisquer outras leituras sociais. E, inclusive, vira alvo de manipulação política, com o respectivo silêncio em ano de campanha eleitoral.

Nesta semana, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que aumenta a pena para traficantes de crack. A lei atual define reclusão de 5 a 15 anos para tráfico de entorpecentes. Se o projeto passar pelo Senado, o tráfico de crack passaria a ter pena de, no mínimo, dez anos de cadeia.

A notícia é boa, mas não desata o nó por inteiro. O consumo de crack é um caso de saúde pública, que envolve estrutura de tratamento, internação e recuperação dos usuários. É fundamental a criação de um sistema de atendimento que conecte cidades de uma mesma região, com a formação de equipes multidisciplinares, de médicos a psicólogos, de enfermeiros a assistentes sociais.

Neste ponto, nascem as fantasias, os delírios e os silêncios da classe política. Até o momento, a campanha eleitoral nos traz mais profetas do que administradores municipais. Todos professam em tom abstrato, evitam se comprometer com prazos, programas e medidas concretas.

Quando tagarelam um pouco mais, reciclam (ou resgatam, palavrinha adorada) projetos faraônicos que pulam de gaveta em gaveta há anos. Ou se dizem pais de crianças que já cresceram, tanto tempo faz que a obra foi concluída. Com o atraso de praxe, é claro.

Nenhum candidato abre a boca ou se mostra interessado em mexer na ferida do crack, fora a retórica pontual. Os consumidores vivem nas catacumbas sociais e representam as sombras que muitos desejam limpar de seus olhos. Não é difícil localizar os usuários, espremidos em guetos de vida noturna. A praça do INSS, na Aparecida; a Gruta de N.Senhora de Lourdes, no José Menino; a linha trem, entre as ruas Silva Jardim e Campos Melo.

Eduardo teve sorte. Seus parentes se uniram para ressuscitá-lo. Tios separaram roupas. Ele ficou alguns dias na casa de uma prima. Pode fazer refeições completas até que um dos primos conseguisse vaga em uma clínica particular. Eduardo está internado há um mês, com bons sinais de recuperação. Só falta – e não depende da família - transformá-lo em regra.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Carta ao Cascão


Caro Cascão, escrevo para me desculpar com você. Usei seu nome em vão. Não cheguei a gritar aos quatro ventos. Sequer sussurrei com amigos próximos, como fofoca de família. Mas o ato de pensar em seu nome me deu a sensação de cometer uma injustiça.            

Você, Cascão, nunca espalhou sujeira. No máximo, uma fedentina que afetou os amigos próximos, principalmente o que fala errado. Por causa do medo de água, te confundi com outro personagem de seu universo, o Capitão Feio. Ao morar nos esgotos, este vilão obscuro sempre tentou te arrastar para o caminho da poluição, mas jamais conseguiu por ser contra sua natureza.

Lembrei-me de você como metáfora do que acontece na minha cidade. Você personificaria o comportamento de centenas de candidatos que, como o Capitão, emporcalham o cenário de tantas histórias. E o chiqueiro só aumentará até outubro.

Os “sugismundos” não são criativos. Copiam uns aos outros como seres da mesma espécie. Começam a invasão lentamente, com os cartazes lambe-lambe. Misturam-se a shows, ícones religiosos e publicidade em geral.

Tenho saudades de um grupo que, com humor, escrevia mensagens em cavaletes de candidatos, há quatro anos. Conheci alguns dos autores que, espirituosos, entendiam sua arte como protesto e reuso destes objetos que massacram visualmente as esquinas.

Mas a luta deles é inglória. A sujeira, caro amigo, ganhou tamanho e mobilidade. Os colantes, antes tímidos, agora ocupam todo o vidro traseiro dos carros, fora as bicicletas. Nomes, números, slogans clichês e rostos sorridentes se cruzam em um trânsito cada vez mais entupido pela cultura do automóvel e pela ausência de políticas públicas de transporte.

Cascão, sua aversão ao banho nasceu na mente e nos traços em papel de teu pai, Maurício de Souza. Marcou a infância de muitos leitores iniciantes como eu. Mas você soube “crescer” e estender sua presença em novas tecnologias para alcançar as crianças de hoje. Minha filha brinca com você e o restante da Turma da Mônica na Internet. Meu filho te assiste em DVD.

Os clones do Capitão Feio também descobriram o mundo virtual e o transformaram numa versão emporcalhada da realidade concreta. É chavão, para eles, citar a candidatura de Barack Obama – o presidente dos EUA, sabe? – como exemplo de sucesso na campanha nas redes sociais. Mas ninguém leu as estratégias, todos ignoraram o papel da Internet na política e não entenderam o contexto particular daquele país.

Por conta disso, eles fizeram da tela do computador uma caçamba de entulho. São os mesmos santinhos que calam as bocas-de-lobo, agora na versão on-line. Há candidatos que vomitam fotos de si mesmos a cada meia hora. Quem se julga mais criativo espalha imagens de eventos. Qualquer acontecimento de rodapé de página é alçado à notícia do ano. Missa, churrasco, passeio em calçadão; vida ordinária vira sujeira pública virtual.

Sua sujeira, caro amigo, sempre foi parte de você. Mas apenas de ti. Entre os que poluem a cidade, há até aqueles que se vestem de verde. De fato, meio ambiente é uma retórica que sensibiliza muita gente, porém ausente da prática do dia-a-dia. Se você conhecesse minha cidade, veria quanto as crianças daqui convivem com o cinza do concreto.

Cascão, peço novamente perdão por pensar em seu nome. Sua vida pode ser suja, mas com o lirismo único das crianças que, no máximo, tentam fugir do banho. Por isso, você jamais entenderá até onde poderá chegar o nível de sujeira dos capitães. 

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Horário eleitoral, a esperança?


O horário eleitoral gratuito, que começa em 21 de agosto, parece ser a tábua de salvação para parte das candidaturas à Prefeitura de Santos. A principal delas é a de Sérgio Aquino (PMDB). No levantamento divulgado hoje, pelo Instituto de Pesquisas A Tribuna (IPAT), o candidato do prefeito Papa subiu de 2% para 3,6% das intenções de voto.
            
No último levantamento da Enfoque/Boqnews, divulgado na semana passada, Aquino chegou a 10%, mas segue em quarto lugar. Alcançar dois dígitos, na verdade, soou como fato isolado. O índice reforça a tendência de que a candidatura precisa de mais força para realmente pensar em um segundo turno contra Paulo Alexandre Barbosa. Metade dos entrevistados desconhece que Aquino é apoiado pelo prefeito, o que pode ser uma vantagem para o candidato do PMDB.

O candidato do PSDB, por sinal, somente espera por seu adversário. Na pesquisa do IPAT, Paulo Alexandre lidera com 40,9% contra 19% de Telma de Souza (PT), percentuais quase iguais aos do levantamento da Enfoque/Boqnews (39% contra 18,4%).  

As duas últimas pesquisas de opinião apresentam muitas semelhanças que, se somadas a levantamentos anteriores, se transformam em tendência. Jamais em aposta cega. Em ambos os casos, Paulo Alexandre apresenta crescimento contínuo e Telma, repetidas quedas, que alimentam as chances de Beto Mansur.

O candidato do PP segue em terceiro lugar, mas se aproximou de Telma. Na pesquisa Enfoque/Boqnews, Mansur subiu de 8,8% para 11,2%. Na IPAT, desceu de 18,3% para 12,1%. 

Os dois levantamentos apontam, basicamente, o mesmo percentual para o prefeito, ainda mais que a primeira pesquisa do IPAT aconteceu em maio deste ano. No caso da Enfoque/Boqnews, o intervalo foi de apenas um mês. De qualquer modo, o resultado tornou Beto Mansur – outra vez - perigoso para a candidata do PT.

Os dois trabalhos, no entanto, confirmam que é impossível fechar questão no momento. E reforçam a ideia de que o santista não entrou na campanha eleitoral. Todos os números apresentados acima são oriundos da pesquisa estimulada, quando os candidatos são apresentados aos eleitores.

Na pesquisa espontânea, 54,7% das pessoas ouvidas pelo IPAT não sabem em quem votar. Na Enfoque/Boqnews, pouco mais da metade poderá mudar de voto até outubro.

Por enquanto, o farol aponta que Paulo Alexandre Barbosa já recebeu a chave do segundo turno. A outra vaga estaria entre dois ex-prefeitos e o escolhido pelo atual administrador. Nesta radiografia, os demais cinco candidatos serão moeda de troca para segunda votação. 

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Deus, o candidato



Dizer, hoje, que o Estado brasileiro é laico soa como heresia digna de fogueira. A relação entre política e religião perdeu os pudores como uma pecadora que resolve confessar seus erros diante do sacerdote. As eleições viraram, em várias igrejas, extensão do culto ou da missa, onde se discutem - sem máscaras – projetos de poder.

Não me refiro, claro, aos passeios que os candidatos fazem às instituições religiosas. Pedir votos sempre representou um ato tradicional e ecumênico. É tão comum vermos os políticos sentados na primeira fila de igrejas, templos e até terreiros quanto presenciá-los beijando crianças e idosos em feiras livres. Na fé eleitoral, o candidato vê o passeio como protocolo para levar à vitória, com a complacência de quem recebe o visitante indesejado na casa de Deus.

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, a Assembleia de Deus, por exemplo, estabeleceu como objetivo eleger um vereador em cada uma das 5565 cidades brasileiras. A liderança da Igreja toma como base o Censo do IBGE. No país, são 42 milhões de evangélicos, sendo 12 milhões e 300 mil da Assembleia de Deus, a maior entre as pentecostais.

Política e religião nunca se uniram por missões altruístas, por questões públicas, no sentido literal da palavra. O namoro é sempre permeado pela rigidez moral, sempre genérica no discurso. Moral que esconde a intolerância dos moralistas, soldados de primeira ordem em apontar como os outros devem se comportar socialmente.

O moralismo que contamina a relação entre política e religião disfarça entendimento e preocupação pela coisa pública. Por trás da retórica de português correto e de fala mansa, nasce o olhar segregador que torna a instituição religiosa do candidato um microcosmo essencial para os benefícios quase que exclusivos das medidas sociais.

O suporte para o projeto de poder é a mídia eletrônica. Rádio e televisão, que antes atendiam às grandes instituições, de várias crenças, estão disponíveis para qualquer igrejinha que aluga um galpão ou compra uma antiga oficina mecânica. Entre os gigantes da fé, a Igreja Mundial do Poder de Deus, liderada pelo pastor Valdomiro, arrenda 22 horas diárias de programação televisiva na Rede 21.

O tamanho da casa de Deus não provoca diferenças na condução da palavra. O discurso político é padronizado e misturado à rigidez de comportamento, à batalha contra os assuntos que não se encaixam na doutrina e ao fortalecimento da família, não apenas o núcleo social mais básico, mas também a igreja como extensão do projeto eleitoral.

O Congresso Nacional, por exemplo, serve como termômetro da relação íntima entre política e religião. A Frente Parlamentar Evangélica é formada por 76 deputados federais e três senadores. Em 2006, eram 32 deputados e quatro senadores. Dependendo da questão envolvida, a Frente se transforma em bancada da fé, ao incluir representantes além do protestantismo.

Na eleição presidencial, em 2010, os parlamentares (e suas igrejas) conseguiram manter o debate medieval sobre aborto na agenda do segundo turno. É claro que sob a ótica do moralismo cristão, e não como política de saúde pública. Dilma e Serra caíram, conscientes, na armadilha, o que esvaziou a discussão sobre economia, educação e outros temas relevantes para a campanha eleitoral. 

Religião sempre será uma ação política porque, quando institucionalizada, se transforma em entidade com interesses que passam longe da pureza. E política não é necessariamente religião, embora seja uma questão de fé.