terça-feira, 18 de outubro de 2016

Setembro, o ano inteiro


Marcus Vinicius Batista

As fitas amarelas saíram dos casacos, vestidos e camisetas. A passagem do mês mudou a cor. O outubro é rosa. A campanha é igualmente importante. Importante é que não troquemos uma pela outra.

Em setembro, suicídio entrou na agenda social. De debates nas universidades a programas de TV. De reportagens na imprensa a relatos de familiares e amigos. A campanha "Suicídio - é possível prevenir" cutucou um tabu que resiste o ano inteiro, que fingiu fraquejar no mês passado.

O suicídio está entre nós, como ação humana que independe de classe social, religião, cor da pele, lugar, gênero ou idade. O suicídio é uma questão de profunda gravidade, que precisa ser tratada como de todos. Quem não conhece alguém que se matou? Algum parente ou amigo que sofreu a perda, passou pela impotência de desconhecer que o suicida sofria calado, sofria invisível?

Assim como fugimos da morte ou a transformamos em espetáculo, destinamos o silêncio ao suicídio. É essencial tratar sem moralismos como fraqueza, egoísmo ou imaturidade. Suicídio é a resposta para o sofrimento contínuo e subterrâneo. É a resposta para todas as respostas que falharam.

Segundo o Centro de Valorização da Vida (CVV), o Brasil registra 25 suicídios por dia. Mas o número é subestimado. Muitos casos são registrados como acidentes ou como mortes sem causa aparente.

A Organização de Saúde (OMS) defende que 90% dos casos poderiam ser evitados se houvesse uma rede de atendimento. É...falta política pública em todos os níveis, sem falar que a saúde mental é o primo miserável na fila das verbas para o setor.

Para cada suicídio, a OMS fala em 20 tentativas. Mas o número é subestimado, pois só contabiliza os casos registrados em hospitais. Muitas vezes, o suicídio - por ser tabu - é enterrado nos armários da família, no silêncio dos colegas de trabalho, na mudez dos parentes e amigos próximos, que ajeitam válvulas de escape para criar outros temas ou simplesmente amenizar as feridas que seguem abertas. A OMS calcula que um suicídio afeta de cinco a dez pessoas próximas. Temos que falar sobre isso.

O suicídio está além da associação com loucura ou com a exclusividade da depressão. Ou com a perda de emprego. A morte é o final de um processo, com alertas de toda ordem. O suicida sempre dá sinais antes de tentar acabar com a vida. Ou melhor, com a dor. E conversar sobre o que o aflige é um caminho para o acolhimento, que pode aliviar as dores, que pode vislumbrar um caminho novo.

Conversar sobre o tema, tirar o manto do tabu é, acima de tudo, ouvir. Ouvir. Ouvir. O que menos ajuda são dedos apontados, determinar o que o outro deve fazer ou acusá-lo de fragilidade, de infantilidade, de fuga.

O suicida não é um covarde. Tampouco um corajoso, capaz de acabar com a própria vida. Isso não vem ao caso. O suicida em potencial precisa de alguém que o escute, que o ampare para torná-lo visível e relevante. O CVV, trabalho voluntário de escuta, deveria estar em todos nós.

As campanhas mudam de cor. Do amarelo para o rosa. Em novembro, o azul. Por que não podemos adotar o arco-íris o ano inteiro?

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