domingo, 28 de outubro de 2018

Carta ao Fernando (a não ser lida – Parte I)


Marcus Vinicius Batista

Caro Fernando,

Quando passar a ressaca da festa, uma virada histórica sem precedentes, tenho certeza de que você vai colocar a mão na cabeça e pensar: venci de que maneira? E o que fazer agora? Como conquistar a outra metade que me rejeitou com veemência?

Você, certamente, não terá uma longa lua-de-mel com a vitória. A fiscalização será acirrada, ao menos nas primeiras semanas do seu governo. A curto prazo, haverá truculência, possíveis protestos, violência, nada incoerente do trajeto percorrido por esta campanha eleitoral, suja, sem debates, com raras propostas, inclusive da sua parte, convenhamos.

Muitos vão te acusar de ser um fantoche. O adversário, você sabe, o intitulava “poste”. É um ponto a ser contestado no poder. Assim como foi feito na Prefeitura de São Paulo, cidade territorialmente favorável ao quase nanico PSDB.

Espero que você reaja, como muita gente escreveu, conversou, bradou, pregou. Ao se sentar na cadeira do Palácio do Planalto, desejo que a criatura se volte contra o criador. Ou, pelo menos, ande com as próprias pernas. Você não estaria onde se encontra sem o apoio ou a chancela de Lula.

No entanto, até para ser decente com a figura de pai que tanto Lula gosta de cultivar, é preciso inseri-lo no lugar adequado da História. Lula é um líder, independentemente de seus atos, mas é a hora de pegar o boné. Não quero mártir sonhando com a capa de super-herói. Desejo um líder que saiba a hora de sair de cena e resolver seus próprios fantasmas.

Fernando, você tem a oportunidade única – com o poder em mãos – de reabilitar seu partido. Terceira chance, o que poucas pessoas recebem na vida. Limpe a casa. Estimule a punição de quem pecou além dos limites. Isso reforçaria a tais instituições, tão defendidas por você e por outros para manter a democracia de pé.

O PT te levou ao segundo turno. O PT quase provocou sua derrota. Você sabe o quanto o voto punitivo (anti-autoritário) colaborou com sua vitória. Dois candidatos com mais de 40% de rejeição. Foi uma eleição sui generis.

Não permita que os demais caciques rifem o partido outra vez. O PT precisa voltar a fazer jus ao nome que compõe essa sigla tão manchada pelos seus “companheiros”. É, creio eu, a última oportunidade de dedetizar um partido que passou por tantos buracos em quase quatro décadas. Que quase fechou as portas por causa do fedor exalado por uma minoria.

Fernando, você tem a obrigação de ser um presidente acima de todos. Todos quem? De saída, as lideranças que tentam sobreviver jogando e ditando cartas nas prisões. O PT não é apenas eles. O PT é aquele militante que vota com esperança. O PT é aquele que mudou de voto porque se decepcionou e ouviu tantos “eu te disse” depois de testemunhar a arrogância política de quem vislumbrou projetos de poder, e não de governo.

Tenho ciência de que você é um sujeito preparado para o cargo. Sei que, no máximo, saiu chamuscado do incêndio que corroeu aqueles que ajudaram a te construir. Mas é fundamental provar, inclusive para quem defende limpeza étnica, social e um monte de outros aspectos que justificam violência verbal, psicológica e física, que a democracia apanhou e segue de pé.

Não haverá outra oportunidade, caro presidente. Como professor, aprenda com os erros seus e de seus colegas, dialogue em vez de ser professoral, a arrogância dos didáticos, ensine seus adversários. Governe para todos e resista aos peixes podres que nadam sorridentes pelos corredores do Congresso Nacional. Vá além dos muros do Partido dos Trabalhadores.

Boa gestão! Um abraço!

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