quarta-feira, 24 de outubro de 2018

A orgia política




Marcus Vinicius Batista

Qualquer criança sabe: a campanha eleitoral reproduz – como bem disse um grande amigo – as brigas entre o 5º ano A e o 5º ano B. Valem cusparadas, xingar a mãe, socos em frente ao colégio, pancadaria dentro de quadra no interclasses e até o grito de “ai ai ai, não deixava”.

Ao longo do ano, os alunos se esquecem porque surgiu a rivalidade entre eles, pois sabem que o que importa é dar a última palavra, mesmo que seja baseada em mentiras deslavadas, que afundam no universo imaginário de um moleque de 11 anos, louco para se afirmar entre os colegas.

Vivemos uma disputa entre dois modos de ver o mundo. Não é preciso explicar quais são, dentro da corrida presidencial. No governo do Estado, não são dois mundos, mas o mesmo endereço e a negação de relacionamento com o primo chamado de leproso, aquele que ninguém quer ver na ceia de Natal (expressão de outro grande amigo).

A luta de classes – interprete como quiser, seja pela veia marxista ou pelo 5º ano da escola – faz com que pouco saibamos o que efetivamente cada candidato pretende para o país. Esqueça os planos de governo, que sempre foram tratados como peças de ficção, pois são reescritos durante a campanha ou têm itens negados para simplesmente sumir no fosso da Internet depois da contagem de votos.

Santos, a cidade onde moro, é um endereço que costuma refletir o cenário político, em termos estaduais. No âmbito nacional, vemos lampejos conceituais, de leitura filosófica dos processos políticos. Em outras palavras, a cidade viveu no final do século passado e no início deste um reflexo do que tinham se tornado as campanhas políticas. Prevaleciam as propostas dos “gerentes”, não porque todos os candidatos eram mais sofisticados, mas porque o eleitorado rejeitava o perfil “metralhadora giratória”, o candidato que só atacava e nada propunha.

Numa das vitórias de Beto Mansur na disputa pela Prefeitura, um dos adversários caiu de terceiro para quinto – e assim acabou em empregos públicos por indicação – por conta de ataques aos candidatos que estavam à sua frente nas pesquisas. Ele acabou visto, por parte do eleitorado, como um pretendente sem conteúdo, sem atrativos para cortejar a noiva. E olha que possuía bons dotes em níveis estadual e federal.

Hoje, os presidenciáveis e os potenciais governadores de SP ultrapassam os limites da ética, da decência, da humanidade. É óbvio que devemos olhar para o comportamento moral de um candidato, mas o moralismo substituiu de maneira porca, perversa o conceito anterior. Enquanto um foge de propostas e alimenta fantasias genéricas, o outro ataca para se defender. As ideias se perdem no cheiro fétido da tampa do esgoto recém-aberta.

Se olharmos como Poliana, saberemos pelo menos que modo de vida, que mentalidade cada candidato – seja em Brasília ou em São Paulo – defende. É um começo, mas parece muito pouco para entendermos o que virá nos próximos quatro anos. Parece-me claro como se processa o funcionamento mental dos presidenciáveis, por distorção comportamental ou por desvio de foco, algo mais nebuloso entre os candidatos ao Governo do Estado.

No entanto, fica difícil desenhar com firmeza uma espinha dorsal de projeto de governo. Vemos projetos de poder. Neste caso, o lápis treme na criação do traço. A ilustração está desfocada, o que aguça a imaginação, a alucinação e até o delírio de quem o observa.

O triste é que temos os candidatos que merecemos. O eleitor é conivente, cúmplice da selvageria e da sangria verbal. Ainda assim, terá que escolher um, por voto útil, convicção ou somente ódio.

Na orgia política, não existem vítimas, tampouco santos. Só os de fala oca. Como as bravatas da turma do 5º ano.

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