sábado, 6 de agosto de 2016

A caça ao Zé das Medalhas

Zé das Medalhas, personagem interpretado por Armando Bogus

Marcus Vinicius Batista

A Câmara de Santos aprovou o projeto de lei do vereador Benedito Furtado (PSB) que diminui pela metade o número de homenagens que cada parlamentar poderá conceder durante os quatro anos de gestão. Com a mudança, cada vereador só poderá entregar duas placas comemorativas e duas medalhas Braz Cubas. Ficam mantidos dois títulos de cidadão santista ou de cidadão santista emérito.

A justificativa é que as homenagens seriam mais valorizadas, o que evitaria a banalização das honrarias. No entanto, a questão me parece mais profunda, dentro da mentalidade presente na política brasileira desde o período colonial.

O projeto de lei, ao tratar de um assunto cosmético, indica o quanto se perpetua o hábito de se legislar sobre tudo. Qualquer problema que poderia ser resolvido com bom senso ou parcimônia necessita de uma lei que, em tese, colocaria um ponto final.

Os políticos adoram pregar um broche ou pendurar uma medalha para agradar o resto da turma. Na fase colonial, os sujeitos bem quistos ganhavam um cargo com a palavra "mor". Ou seja: mais, diferente, acima dos outros.

No século 19, os amigos do imperador eram acariciados com títulos de nobreza, como barão, conde, duque, visconde, marquês. Era a retribuição pela lealdade, pelos serviços prestados ou para selar a troca de favores.

Com o Brasil-República, permaneceu a cultura de distribuição de títulos aos amigos do "rei". Muitos dos premiados, inclusive, acumulam comendas como heróis de guerra. Ou ostentam nomes informais que simbolizam poder, como comendadores e coronéis.

O projeto de lei me fez lembrar de um personagem da novela Roque Santeiro, de Dias Gomes. Na trama, Zé das Medalhas, um sujeito mesquinho e avarento, acaba afogado nas próprias medalhas que tanto prezava.

Se somarmos os 21 vereadores, a Câmara poderá conceder, a cada quatro anos de mandato, 42 placas, 42 medalhas Braz Cubas e mais 42 títulos de cidadão santista. Dá ou não para lembrar do destino final do Zé criado por Dias Gomes?

Obs.: Texto publicado no Diário do Litoral, em 5 de agosto de 2016.

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