sexta-feira, 30 de setembro de 2016

O emprego mais disputado do ano


Marcus Vinicius Batista

A crise econômica muda as relações de trabalho. Não é momento de escolher um lugar no mercado. É hora de estar empregado, ainda mais com o alto risco de demissão.

O anúncio da abertura de vagas em Santos atraiu gente de todo lado, de todo tipo de escolaridade, religião e experiência. A fila daria volta no quarteirão se o processo de seleção não fosse à distância. Uma série de etapas, com duração de 45 dias. Muitos se preparam há quatro anos; outros se satisfazem em imprimir o currículo.

A seleção envolve entrevistas, dinâmicas de grupo e reuniões com clientes e fornecedores. Não é para qualquer um. Nesta crise, poucas firmas podem se orgulhar da abertura de 21 vagas.

Cerca de 380 pessoas se inscreveram na filial de Santos. A promessa dos recrutadores é igualdade e imparcialidade na escolha dos candidatos. Não é preciso experiência, mas se sabe que - outra vez a crise - há profissionais com 30 anos de estrada. Gente que largou tudo pelo sonho de trabalhar ali.

Não é concurso público. Os contratos são temporários: quatro anos, com chance de renovação pelo mesmo período. A instabilidade é compensada pelo horário flexível, folgas nos finais de semana e férias duas vezes ao ano. Horário, horário mesmo!, só duas vezes por semana, ainda assim no final da tarde, depois das 18 horas. Dá até para conciliar com outra atividade para engordar o orçamento em casa.

A firma permite que o funcionário escolha não apenas os projetos nos quais pretendem trabalhar, mas também defina sua equipe de trabalho. A firma garante que o mérito prevalece e que eventuais repetições de sobrenomes são meras coincidências.

Além dos benefícios, o salário é único no mercado. Hoje, o contratado recebe, assim que entra na firma, R$ 9.938,34. Só que este processo de seleção, com início de trabalho em janeiro de 2017, prevê que os vencimentos pulem para R$ 12.091,71. O sujeito, antes de assinar o ponto pela primeira vez, já recebe um aumento de 22%.

Impressionado com o emprego? Os atuais "colaboradores" garantem que o salário poderia ser maior. Eles fizeram o favor de preservar o caixa da firma e o bolso dos clientes. Um vereador, por lei, pode receber até 60% da remuneração de um deputado estadual. Ou seja: R$ 15.193,35.

Como dizem as cartilhas, é nas crises que nascem as oportunidades. Para poucos!

Obs.: Texto publicado no Diário do Litoral, em 29 de setembro de 2016.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

O candidato-slogan



Marcus Vinicius Batista

"Eu sempre estive presente. Meu compromisso é de luta, pela saúde, pela educação e pelo emprego. Mas também trabalho, incansavelmente, em defesa da família e de Deus. Sou a renovação, a mudança para o novo.

Sou um homem de ação, que apresenta a você um jeito diferente de fazer política. Vou renovar com seriedade, não de qualquer jeito. Sem promessas, apenas trabalho. É meu compromisso atuar sempre pelo social.

Conheça minha força, a nossa força, porque juntos somos mais pela nossa cidade. A cidade, afinal, bate em nossos corações. Faço tudo por ela, farei tudo por todos! Na verdade, já fiz e farei muito mais!

Chegou a nossa vez. Vou trabalhar com dedicação e trazer os resultados que a cidade precisa. Comigo, a cidade será forte, vai avançar e será inovadora. Sou a criatividade, a sinceridade e meu compromisso é com a verdade.

Trabalharei sem medo, a favor da população e contra a corrupção. Eu tenho garra e, por isso, levarei a cidade para frente. Juntos, o futuro será aqui. Pode acreditar que farei o bem e jamais olharei a quem. A cidade é de todos nós.

Sou a mudança. Venha fazer parte dela, conosco. A cidade será forte, com ação e compromisso público. Ela merece mais. Ela merece menos promessas, merece mais comprometimento. Somos a força da educação. Mais do que ser o amigo da educação, serei o amigo da família.

Tenha certeza de que sou confiável. Vamos em frente porque a confiança está acima de tudo. Diga sim para a nossa cidade. Liberte-se e pense comigo.

Sou a segurança. Trabalho pela segurança. Vamos brilhar juntos nesta mudança. Sou do bem. Você pode me conhecer e compartilhar essa esperança de levarmos o novo para a política. Governaremos com amor, pois sou um homem de palavra, cercado por mulheres de ação, mulheres de peito.

Vote consciente! Vote em mim!"

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Observação: caro leitor, você estranhou esse texto? Ele é somente uma coletânea de slogans de candidatos a prefeito e a vereador de cidades da Baixada Santista. Entre as rimas pobres, você identificou algum deles? Um texto oco para promessas vazias.

* Texto publicado no Diário do Litoral, em 25 de setembro de 2016.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

O efeito Carina

Lula e Carina Vitral, na convenção, em Santos. Qual é o peso do PT?
Foto: Agência PT

Marcus Vinicius Batista

A candidata Carina Vitral (PC do B) consegue estar em dois lugares ao mesmo tempo, na corrida eleitoral. Mas ambas as posições, se observadas em conjunto, indicam que a candidatura enfrenta dificuldades.

Carina aparece em segundo lugar em quase todos os momentos, com variação de 5 a 8% das intenções de voto. Se a vice-liderança não refresca em nada o cenário de reeleição do prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), Carina poderia compreender que a segunda posição a aprova para uma candidatura ao Poder Legislativo, em 2018.

O que inviabiliza a candidatura de Carina Vitral à Prefeitura de Santos é um detalhe que faz a diferença na urna. Na pesquisa Enfoque Comunicação/ Jornal Boqnews, Carina lidera, de forma escandalosa, a rejeição dos eleitores. Em outras palavras, 37,7% dos entrevistados jamais votariam nela. Ela só perde para os indecisos, que somam 39,2%.

O prefeito, por exemplo, apresenta rejeição de 7,4%, um quinto do índice de Carina Vitral. Na sequência, vem Marcelo Del Bosco (PPS), com 2,9%. Daí para baixo, até chegar em Hélio Hallite (PRTB), o último da lista de rejeição, com 1,1%.

O que leva parte do eleitorado santista rechaçar a candidatura dela? Carina cometeu seus próprios pecados, mas também paga pelas heresias alheias. A candidata do PC do B é alvo de preconceito, por exemplo. Os eleitores mais velhos e de classes mais altas a enxergam como inexperiente e jovem demais para comandar a cidade.

Essa posição é interessante, pois esconde outros estigmas. Se compararmos, o atual prefeito não tem 40 anos e venceu a primeira eleição, para deputado estadual, com menos de 30, quando assumiu secretarias estaduais no governo Geraldo Alckmin.

O pacote se acentua com informações como tempo de vida universitária na PUC-SP, voz infantilizada ou não morar na cidade. Tudo é perfumaria para mascarar a essência da rejeição.

Carina Vitral paga a conta por causa do apoio do PT. Não é o PT em Santos, mas a instituição nacional. É importante ressaltar que o candidato à vice, Reinaldo Martins (PT), não tem peso nesta história. Ele é visto como um sujeito de comportamento irretocável, de vereador à secretário municipal.

Telma de Souza, a maior liderança local e articuladora da candidatura de Carina, traz consigo alto índice de rejeição. No caso dela, irrelevante para uma candidatura à vereadora, mas uma indireta para Carina.

Se a aliança com o PT deu visibilidade à Carina Vitral, o mesmo motivo a tornou telhado de vidro. O apoio da UNE ao governo Dilma também colaborou para o entendimento de que a candidata é petista. Isso numa cidade (ou parte dela!) que não elege o PT desde David Capistrano.

A campanha de Carina também perdeu tempo em explicar as origens dela e em ataques à gestão atual. Isso atrasou a construção de uma imagem como alternativa, que fosse capaz, inclusive, de diferenciá-la dos demais concorrentes, que - por razões óbvias - batem na mesma tecla.

Carina Vitral é uma personagem interessante para reflexão nesta disputa previsível. O problema é que ela talvez tenha escolhido os amigos errados, na visão de boa parte dos eleitores.

domingo, 25 de setembro de 2016

O leite esquenta, mas não queima



Marcus Vinicius Batista

A campanha para prefeito de Santos correu morna até essa semana. Até que brotou um vídeo que denuncia a existência da compra de apoio por parte da administração municipal. O vídeo mostra o ex-ouvidor municipal Flávio Jordão falando sobre a compra de integrantes de dois partidos, que seriam recompensados com cargos na Prefeitura.

O vídeo circulou na Internet e foi divulgado pela imprensa local. O material esquenta - mas nem tanto - a corrida eleitoral, que entra nos últimos 10 dias. A primeira sensação é de que o vídeo se mostra insuficiente para alterar o estado de coisas, que caminha para a reeleição de Paulo Alexandre Barbosa.

A denúncia também permite reflexões sobre as reações da classe política e, principalmente, de parcela do eleitorado. A primeira delas é óbvia: os assessores de Paulo Alexandre Barbosa e do PSDB foram para o ataque. A estratégia abriu duas frentes. De um lado, diminuir e desmerecer a denúncia, qualificada como "campanha suja".

De outro, entrar na Justiça para contestar o vídeo. O próprio ato de transformar um fato político em judicial cria o verniz que ameniza o impacto da notícia. O foco se desvia e outros assuntos surgem na pauta, que tornam a gravação em si um ator coadjuvante. A Ética, então, é rebaixada à figurante.

O vídeo tende a soar como fato isolado, sem outros temperos suficientes para atrair a atenção de um eleitor acomodado, confortável e disposto a não se arriscar como novos nomes, um tanto quanto parecidos numa leitura superficial. Este eleitor não procura informações num misto de descrença e desconfiança.

O vídeo tem o poder de sacudir quem já tem calafrios com nesta eleição. Falo dos eleitores iniciados, de oposição declarada, de olhar dissonante numa cidade em ponto morto. O eleitor médio, vamos dizer assim, é - em termos históricos - capaz de perdoar o que julga "pequenos" deslizes, diante de um bem maior, ou seja, sua própria visão de cidade, de política e de benefícios públicos. As pesquisas eleitorais, sem exceção, apontam para uma postura - da maioria de eleitores - de ojeriza ao conflito, à desavença, à necessidade de colocar perspectivas diferentes numa balança e refletir a respeito.

Esta denúncia se parece com o leite que esquentamos na panelinha velha antes de dormir. A bebida ficará morna, não queimará a língua e jamais vai transbordar porque não ferveu. Mas, como diria minha avó, onde há fumaça ...

Obs.: Texto publicado no Diário do Litoral, em 22 de setembro de 2016.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Uber X táxis - Parte 3 - Os políticos



Marcus Vinicius Batista

A disputa entre Uber e taxistas coloca os vereadores como passageiros, de carona, sem querer pagar pela corrida. Com a campanha eleitoral, ficou evidente que os parlamentares, de olho nos votos de motoristas e simpatizantes, aplicaram sem pestanejar a Ética pragmática de Nicolau Maquiavel, resumida e distorcida pela frase "os fins justificam os meios".

O processo vem desde o ano passado, quando o vereador Ademir Pestana (hoje PSDB, mas que um dia foi PT, é possível na política) fez sua escolha. Ele, pressionado por taxistas, entrou com um projeto de lei, aprovado por quase todos os colegas. Só dois votos foram contrários. O prefeito Paulo Alexandre Barbosa sancionou e a vida parlamentar, de costas para a cidade, seguiu em marcha ré.

Quando o Uber se tornou um serviço de boa aceitação em Santos e a campanha eleitoral se fez presente, começaram a aparecer os pais da criança e os candidatos que tentam apagar o passado. O autor do projeto de lei, por exemplo, se viu no meio do fogo cruzado entre simpatizantes do Uber e taxistas. As redes sociais, neste sentido, funcionam como terra sem lei, tanto quanto as ruas onde carros têm vidros quebrados e motoristas, ameaças de agressão.

Um dos vereadores que votaram contra a lei que proíbe o Uber fez o que se esperava de um candidato à reeleição: tentou capitalizar em torno do tema. O problema é que o passado também o condena. Ele votou no ano retrasado pelo aumento do IPTU e assinou embaixo na autorização para que Organizações Sociais gerenciassem serviços de saúde, em Santos.

Saúde é o primeiro tema da lista de prioridades para os eleitores, nas duas pesquisas divulgadas até agora. Os pronto-socorros colecionam problemas, e o Hospital dos Estivadores (que ganhou o nome fantasia-eleitoral de Complexo Hospitalar) enfrenta a complexidade do mau planejamento. É um prédio pronto, com dificuldades financeiras para se equipar e contratar pessoal.

No começo do mês, um vereador da base governista postou em rede social que a lei que proíbe o Uber "não fede nem cheira" e que haveria problemas jurídicos para fazê-la funcionar, de modo efetivo. Ele votou a favor do projeto de lei.

Como um vereador vota em um projeto que julga irrelevante e inoperante? Qual é a responsabilidade exercida em plenário? Qual é o compromisso com o interesse público, se o voto se torna mero protocolo para manter a boa relação com colegas e Poder Executivo?

As palavras do parlamentar nos servem para ligar a luz amarela diante do problema entre Uber e taxistas. Até que ponto os vereadores enxergam a questão como um ponto central na política de transportes e trânsito? Conseguem visualizar os impactos sociais, tanto para motoristas de Uber como para taxistas, diante do desemprego derivado da crise econômica?

Neste ano, Santos tem cerca de 380 candidatos a vereador. No horário eleitoral gratuito, os discursos genéricos e distantes da realidade de um vereador se amontoam na selva da desinformação. Uma minoria se perde na floresta de intenções duvidosas.

Enquanto a eleição corre à margem da vida real, taxistas e motoristas de Uber entram em conflito nas ruas de Santos. No final das contas, ambas as categorias foram abandonadas por aqueles que os enxergam apenas como votos ambulantes motorizados.

Pior para os taxistas, que não percebem como a imagem arranhada pela truculência de poucos e pelo teatro eleitoral reduz as oportunidades de trabalho e tira o foco sobre as mudanças para atender o único interessado: o consumidor. Consumidor, e não eleitor, o sujeito que paga as contas. 

Outros textos sobre o assunto:

1) Entre Ubers e táxis, quem ganha é a imagem


Obs.: Texto publicado no site Juicy Santos, em 6 de setembro de 2016.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Meu candidato



Marcus Vinicius Batista

Meu candidato é uma silhueta no horizonte eleitoral. Mal consigo vê-lo, e sua voz é abafada pelo coral desafinado de promessas e propostas. Diante da incerteza, o que posso esperar dele ou dela? O que não posso tolerar?

Meu candidato pode ter nascido em qualquer lugar. É provinciano bufar para que seja na mesma cidade onde concorre. Certidão de nascimento não é atestado de competência ou critério de voto. Também não há necessidade de morar aqui por décadas.

Basta conhecer bem o território e suas dificuldades, além de apostar em pessoas que compreendem as nuances do local. Conheço gente que mora na minha cidade há meio século e nunca saiu de três ou quatro bairros perto da praia, mais dois shoppings de bônus.

Meu candidato não precisa ter família de comercial de margarina. A cidade procura por um administrador, não alguém para se sentar na cabeceira da mesa no almoço de domingo. De preferência, a família deve ser pequena; assim, haverá menos gente para pedir privilégios e exigir que seja encaixada em qualquer repartição pública.

Meu candidato não precisa ter religião. Nem carece de ser um homem de Deus. Basta ter fé, sem desejar ser messiânico ou falso profeta. A fé, neste caso, serve para resistir às tentações, sobreviver às tempestades políticas e olhar de frente para o sete peles, este no corpo de adversários e também de aliados. Ao tomar pé das finanças, o eleito terá certeza de que o inferno é aqui.

Meu candidato não precisa prometer que cuidará ou acolherá os moradores. O anúncio recruta um profissional com capacidade administrativa, e não pai ou mãe. Pai e mãe podem ser afetivos ou cruéis. Confundem sentimentos com razão e abusam de poder quando definem todas as relações com seus "filhos" como verticais. De Getúlio a Lula, de Maluf a Dilma, de JK a Temer, dispenso inclusive os padrastos.

Meu candidato não precisa estabelecer uma relação de amizade. Não quero abraços, beijos, sequer um aperto de mãos ou sorriso amarelo. A vaga, que paga bem, exige alguém que apresente soluções compatíveis com a cidade, sem levá-la à falência ou deixar defuntos no armário para o sucessor. Se os administradores mudam, os moradores ficam e sofrem.

Meu candidato pode estar de dieta. Não precisa ser maratonista gastronômico. Pastel de feira com caldo de cana, cafezinho com pão na chapa na padaria, restaurante de um real, tudo no mesmo dia. É melhor alimentação equilibrada do que ser afastado do trabalho por pressão alta, colesterol, diabetes. Os excessos com a comida ficam por minha conta.

Meu candidato deve andar com pés nos chão para fugir da arrogância megalomaníaca. A cidade não precisa de elefantes brancos desfilando pelas principais avenidas. Muito menos de obras cosméticas, que serão refeitas depois de três, quatro anos, porque o eleito mudou de ideia. Caminhar com firmeza é a singela compreensão de que a cidade pulsa pelas pessoas, muito mais do que por carcaças de concreto e ferro com nomes gourmets.

Ele (ou ela) ainda é um desconhecido. Olhando para o horizonte, tenho dúvidas: meu candidato é uma miragem, alguém que se aproxima ou um espírito disposto a puxar meus pés no dia 2 de outubro?

domingo, 18 de setembro de 2016

Voto nulo: uma saída possível



Marcus Vinicius Batista

Cubro eleições desde 1992, quando David Capistrano derrotou Vicente Cascione no segundo turno, para a Prefeitura de Santos. Confesso que, no século passado, defendia a ideia de que o voto nulo era maléfico ao processo eleitoral. Talvez teimosia de um jornalista jovem.

Entendia, naquela época, que anular o voto significava lavar as mãos para o processo eleitoral. O pecado pela omissão, que não me daria o direito de cobrar ou questionar as decisões tomadas pelos candidatos eleitos.

Hoje, diante da experiência, penso diferente. O voto nulo não é um mal necessário, mas uma alternativa sólida quando o cardápio só nos oferece pratos indigestos. Recusar-se a escolher alguém é, óbvio, uma escolha, ainda mais com muita informação que a sustente.

Como professor, costumo ouvir a mesma pergunta sobre o voto nulo a cada dois anos. O voto nulo vai para o vencedor da eleição? Como contagem absoluta de votos, não. Os nulos e brancos giram em torno de 15 a 20% dos votos.

O problema é a matemática. Quanto mais nulos e brancos, menor será o número de votos válidos. Isso interfere na porcentagem dos votos nos candidatos ao Poder Executivo, por exemplo, o que pode resultar na diferença entre uma vitória no primeiro turno e a chance de realização do segundo turno entre os dois primeiros colocados.

Na eleição para vereador, a chamada proporcional, os nulos podem provocar acréscimo ou redução da quantidade de votos para se fazer uma cadeira na Câmara. A tendência é que, de fato, favoreça as candidaturas mais fortes, em alianças que giram em torno do nome favorito ao Poder Executivo.

Em Santos, muitos olham para os votos nulos com expectativa. A descrença na política poderia levar a um estouro de votos de protesto, não em candidatos. No entanto, o que costuma acontecer, em termos históricos, é o aumento de abstenções. Ou seja: muitos eleitores preferem fugir ou não se esforçar para exercitar o voto.

Como cidadão, já escolhi um candidato a vereador. Voto em Santos, o que me dá oito opções para prefeito. Descartei seis. Tenho, logo, três alternativas; entre elas, o voto nulo.

Obs.: Texto publicado no Diário do Litoral, em 11 de setembro de 2016.

sábado, 17 de setembro de 2016

O eleitor e seus desejos contraditórios



Marcus Vinicius Batista

A última pesquisa do Diário do Litoral, divulgada essa semana, confirma o favoritismo do prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB) e a divisão de votos nas candidaturas de oposição. No entanto, chama a atenção o comportamento do eleitor diante do futuro gestor da cidade.

São duas perguntas que, juntas, aguçam minha curiosidade e permitem uma interpretação relativa, diante de posições subjetivas e passíveis de mudança do eleitorado. O eleitor, quando inseguro, é volúvel e não costuma se arriscar em territórios mais radicais.

A primeira pergunta é: nessa eleição para prefeito de Santos você pretende votar pela continuidade da atual administração ou por sua mudança? 41% dos entrevistados querem mudança, enquanto 33% preferem a continuidade. 22% não sabem. Na pesquisa de maio, 52% defendiam mudança na administração. Ponto para o prefeito.

Aí vem a segunda questão: nessa eleição para prefeito de Santos você pretende votar em um candidato de situação ou de oposição? 38% dizem que votarão em um candidato de situação, enquanto 25% votarão em um candidato de oposição. 32% não sabem.

A contradição mais evidente envolve a candidatura do prefeito Paulo Alexandre Barbosa. Embora líder disparado em todas as pesquisas, o prefeito enfrenta a desconfiança de parte do eleitorado. Apenas um terço dos eleitores o escolheria, em 2 de outubro, por convicção.

Daí nascem as dúvidas. Os eleitores nos fornecem dois sinais. O primeiro deles é a possibilidade de escolher o prefeito por não ver outras opções.

Os candidatos de oposição, seis deles em primeira campanha, lutam para serem vistos pelo eleitor e para se diferenciar uns dos outros. Muitos discursos são parecidos, o que cria ruído na comunicação com quem desgosta do governo atual e procura uma saída sem acompanhar o cenário político.

Há candidatos demais, o que facilita a vida do prefeito. A última evidência foi o debate essa semana, na Universidade Católica de Santos. Todos contra Paulo Alexandre Barbosa, mas com muito fogo amigo.

O risco da dúvida – e o número de indecisos ainda está alto – é que o eleitor, diante da frágil crença na política, decida pelo voto útil e, assim, siga a manada em torno da candidatura favorita.

Obs.: Texto publicado no Diário do Litoral, em 4 de setembro de 2016.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Cantando o hino nacional



Marcus Vinicius Batista

Quando era criança, eu já desconfiava, sem entender o que se escondia por trás da fila no pátio e dos gritos da professora. No início da década de 80, o hino nacional entrava no pacote que incluía disciplinas como Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política Brasileira (OSPB), ícones educacionais do regime militar.

Depois, adulto, ficou mais claro como se agredia o hino nacional quando a seleção brasileira de futebol entoava os versos para mascarar o eterno uso político do esporte, o balcão de negócio sem pudor ou portas fechadas. Os jogos da seleção representam o momento no qual mais gente se reúne para exercitar o patriotismo de gaveta.

Neste ano, o hino nacional foi assassinado duas vezes, se é possível matar um símbolo de formas repetidas. A primeira foi quando deputados federais festejaram em cima da letra de Joaquim Osório Duque Estrada, depois de promover um espetáculo de grosserias e limitada inteligência na votação pelo afastamento da presidenta Dilma Rousseff. Quem não acompanha política se surpreendeu com o nível de subsolo dos parlamentares, loucos para aparecer na TV.

Na semana passada, a malhação pública do hino nacional se repetiu na outra casa legislativa federal, em Brasília. Os senadores, ao afastar Dilma, mas mantê-la elegível, cantaram o hino e fizeram papel picado da Constituição Federal.

O hino nacional pouco me causa impacto, para ser educado. Não o canto. Mantenho-me silencioso em eventos públicos, em respeito ao que representou na História, não pelo sua exploração atual.

A música e a letra são de um país que não existe hoje. Talvez nunca tenha existido, quando aproximamos a lupa histórica. São símbolos do país do futuro, do gigante que nunca acorda, daquela nação que poderia ter sido.

O hino nacional mais se parece com uma poesia, bela por si mesma, do que um espelho de vidro limpo e brilhante. É necessário esforço para enxergar suas palavras em meio às manchas e ao limo que encobrem a superfície.

Em 7 de setembro, cantar para quê? Na política, o hino nacional está no mesmo time de Deus e da família. Muitos o usam para gastar saliva, mas poucos sabem o que significam. E não falo apenas da óbvia política com mandato, terno, gravata e processos na Justiça.

Obs.: Texto publicado no Diário do Litoral, em 7 de setembro de 2016.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

O eleitor, um bicho fascinante



Marcus Vinicius Batista

O eleitor jamais pode pagar pelo crime de ser otário. Quando escolhe se abster do processo eleitoral, tomou uma decisão política. Quando opta pela desinformação, ele sinaliza para os candidatos: a preferência por suas limitações.

Perdoe-me pela redundância, mas o eleitor é - numa campanha - quem mais se aproxima do ser humano e suas contradições. Ele merece que se desmonte, por justiça, dois mitos em torno de sua imagem.

O eleitor nunca é uma vítima do processo eleitoral. Muitas pessoas podem se colocar nesta posição confortável, que permite escapar da responsabilidade do voto. O eleitor é, ainda que negue, cúmplice. Ao escolher um palhaço sob protesto, ele o faz ciente de que enxerga a política como circo.

Ao votar em um corrupto de carteirinha, ele o absolve pelo que julga serem pequenas penalidades e aplica - por exemplo - bordões como "rouba, mas faz". A condescendência é o olhar, em última instância, de si próprio no espelho, como defensor e praticante de deslizes cotidianos.

Outro mito diz respeito ao voto por consciência coletiva. O eleitor médio pensa em seus interesses. Escolhe por motivos particulares, e não por causas nobres, amplas e sociais. Há, muitas vezes, o autoengano, mas é retórica para elevar a autoimagem diante da mesquinhez política ou do senso comum.

Suas informações são limitadas, que podem nascer dos círculos de amigos; por razões óbvias, pessoas com quem o eleitor assina embaixo. É ingênuo crer que, em face da descrença política, o eleitor será um ávido consumidor de dados e análises para traçar um panorama que o leve a uma decisão racional em estado puro, o mais próximo possível da neutralidade. O eleitor tem posição definida e que pode ser apenas sustentada por preconceitos, estigmas e moralismos.

Estudos de Ciência Política se repetem na percepção de que o eleitor militante e o eleitor alienado em absoluto são minoria no processo eleitoral. O primeiro é devoto de uma causa, partido e/ou candidato. Não muda de opinião como também defende sua escolha, que pode ultrapassar a fronteira da intolerância.

O segundo cria mecanismos próprios de ausência, que oscilam entre a generalização negativa e a decisão unilateral de ignorar discursos e informações sobre a campanha. Não o confunda com os indecisos. O alienado decidiu não votar ou, na pior das hipóteses, flertar com o voto em branco. Pode, talvez, se divertir com a anulação do voto.

O eleitor a ser caçado pelos candidatos é o volúvel, que namora com um candidato, escuta outro, promete casamento com um terceiro para - quem sabe? - subir ao altar com um quarto nome. É o eleitor que decide nas últimas 72 horas, que pode escolher porque o pai, o marido, a melhor amiga ou a esposa indicaram um candidato. Ou definir o voto dentro do colégio eleitoral, com um santinho que caiu a seus pés durante o trajeto.

Por essas razões, o eleitor é um espécime que me fascina. Sua melhor qualidade: a capacidade de surpreender as raposas.

Caro (e)leitor, em qual perfil você se encaixa?

sábado, 3 de setembro de 2016

O PT rosa e a morte da estrela

PT, por que mudaste de cor? 


Marcus Vinicius Batista

Numa campanha eleitoral com muitos nomes novos e poucas novidades estratégicas, o PT tenta vestir outra roupa. Não se trata da influência de Telma de Souza em torno da candidatura de Carina Vitral (PC do B), a juventude que o PT pediu emprestado pela incapacidade de se renovar. Não se trata da humildade à fórceps que resultou na indicação de Reinaldo Martins como vice na chapa, pelo mesmo motivo.

O horário eleitoral gratuito e a propaganda nas ruas apontam para um PT rosa, de motivação e comportamento dúbios. O Partido dos Trabalhadores ficou rosa, de vergonha? Se você ainda não reparou, caro eleitor, o PT lavou o vermelho e o transformou em um tom politicamente correto.

O que significa a mudança de cor? O marketing político não permite passos sem justificativas. Todos os detalhes são testados. A cor é essencial para composição da identidade visual de uma candidatura.

O verde saiu do Diário Oficial para não denotar propaganda da administração Paulo Alexandre Barbosa. O laranja era um dos símbolos da gestão anterior, de João Paulo Tavares Papa.

Para que serve o rosa? Ou melhor, por que abandonar o vermelho, marca de tantas vitórias e derrotas? O vermelho cicatriza o rótulo de esquerda, que o PT mais uma vez tenta evitar numa cidade controlada pelo conservadorismo.

O PT, na vida prática, deixou de ser esquerda desde que pagou o preço da governabilidade para ascender ao poder, em Brasília. A essência do calvário de Dilma Rousseff, alicerçado por políticas econômicas de assustar até os tucanos, passou pelas alianças com o centrão, de múltiplas cores e fome única de poder. Mas o vermelho, embora somente simbólico, compunha ao menos uma referência de cimento ideológico.

A lavagem do vermelho também alcançou o PC do B, que tem a formação histórica comunista, lá no século passado, até no nome. Um partido derivado do PCB, porém aliado de outras horas do PT, com direito à ministério. Em Santos, coadjuvante em outros carnavais eleitorais. O rosa seria para conversar com parte da classe média, que se queixa do PSDB e sempre olha para os próprios interesses?

O PT pode até tomar um banho de loja para sonhar com o convite VIP, mas nada mais grave do que sumir com a estrela. A estrela foi a arma de resistência empunhada pela velha guarda. A estrela representou, acima de tudo, a ascensão do lulismo, presente no jingle histórico das eleições de 1989, comparável à vassoura de Jânio Quadros nos anais da propaganda política. "Lula lá, brilha uma estrela ..."

Aposentar a estrela em Santos, com discrição, semeia uma série de dúvidas sobre o que o PT pretende para o próprio futuro. É atitude desesperada diante de outra derrota nas urnas? É uma maneira frágil de tentar se livrar dos pecados cometidos em rede nacional? É um sinal de renovação dos quadros e das lideranças? Ou apenas uma maquiagem, para esconder as rugas, as estrias e as celulites políticas?

O PT rosa, por enquanto, é verniz. Mudanças dependem de um tempo mais longo, bem além da eleição em 2 de outubro.