Setenta e oito mulheres foram estupradas no primeiro trimestre, na Baixada Santista. Os dados são da Secretaria de Estado da Segurança Pública. No mesmo período do ano passado, foram 55 casos, ou seja, um aumento de 41,8%.
Praia Grande é a cidade-líder. Foram 23 casos de estupro, contra 10 no primeiro trimestre de 2015. Em Santos, o número de casos triplicou, saltando de quatro para 12 registros oficiais de violência sexual. Cubatão, Itanhaém, Mongaguá e Peruíbe tiveram queda no índice de estupros. Cubatão, aliás, não teve nenhuma ocorrência esse ano.
Agora que você, leitor, já conhece parte do caminhão de números, vamos aos fatos. As informações acima são falsas. Não é maquiagem oficial, embora o Governo do Estado já tenha sofrido acusações em estatísticas sobre homicídios. Estupro é um tipo de crime que merece menos atenção dos políticos e da imprensa, em parte porque prevalece um pacto geral de silêncio em todos os níveis.
As estatísticas são falsas porque se baseiam em queixas registradas, seja para policiais militares, seja nas delegacias de polícia. É difícil chegar ao número ideal, mas os dados oficiais são subestimados. Parte dos crimes de agressão sexual não são notificados. Nos Estados Unidos, por exemplo, estima-se em 80% do total de relacionamentos não consensuais, como estupro é chamado por lá.
O segundo fator que mascara o tamanho do problema é que agressores e vítimas se conhecem em três de quatro casos de estupro. O agressor é pessoa próxima da vítima. Pode ser um vizinho ou morador da mesma rua, um colega de trabalho ou de escola, pai, avô, irmão ou amigo da família.
O jogo ganha contornos perversos quando se adiciona o ingrediente machismo. Você se lembra da Marcha das Vadias? Trata-se de um movimento social, de caráter internacional, nascido no Canadá depois que uma mulher foi à delegacia prestar queixa e ouviu de um policial que isso teria acontecido por causa das roupas dela.
É muito comum famílias encobrirem casos de estupro e despejar a culpa na vítima, na maior parte das vezes uma adolescente ou uma criança. O pai, avô, tio ou irmão agressor recebe o apoio das demais mulheres da casa. Há pilhas de histórias em que a mãe se volta contra a filha e faz vistas grossas para os estupros cometidos por um membro da família.
Neste sentido, os números são mentirosos, indiretamente, por conta de uma fantasia. Acredita-se, no senso comum, que o estuprador clássico é aquele sujeito que persegue uma mulher aleatoriamente na rua e a estupra no meio do mato ou em um terreno baldio. Esses casos, claro, existem aos montes e costumam aparecer nos registros das delegacias. Mas não podem ser um estereótipo que ignora uma doença, que corrói dentro e fora de casa, em todas as classes sociais.
O estupro é uma epidemia social e insistimos em nos calar sobre ela.
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