quarta-feira, 25 de maio de 2016

Notórios e notáveis


Marcus Vinicius Batista

Ainda não sei se prevalece a soberba ou a negligência, mas o fato é que o ministério de Michel Temer se tornou capaz de gerar más notícias todos os dias. São incêndios que poderiam ser evitados se o grupo de "notáveis" não se comportasse como um mero grupo de notórios, o que são de fato, conhecidos - em sua maioria - pela imagem carcomida na política.

O último episódio foi a visita de Alexandre Frota, mais a turma do Revoltados Online em pequena participação na cena midiática. Soou como piada pronta a presença de Frota e sua lista de propostas para a Educação brasileira. Um encontro que poderia ser evitado, ainda mais pelos motivos que o levaram a acontecer.

Toda ação política, já pregava Napoleão Bonaparte há 215 anos, precisa de uma avaliação das consequências sobre a chamada opinião pública, expressão essa mais moderna. A tentativa de agradá-la, seduzi-la e domesticá-la é parte da cartilha da propaganda política. Todo governo, pensando aqui de maneira maquiavélica, precisa parecer bom.

É óbvio que parte da imprensa olhará o governo sempre pelo prisma negativo, seja por má fé, seja porque ainda respira a velha máxima do jornalismo como fiscalização do poder. Neste caso, uma minoria, reconheçamos. Mas uma imprensa amiga não basta se o próprio governo, por meio de seus ministros, não colabora.

Houve fatos previsíveis, como as denúncias e a indústria de vazamentos contra membros do primeiro escalão. Não há como se surpreender com a exposição de políticos da velha guarda diante de notórias investigações contra eles. Romero Jucá que o diga! Aliás, a comunicação do Governo tentou encobrir, de maneira amadora, a saída do ministro ao usar a palavra "afastamento", em vez de "demissão". Jornalistas trouxas ou mal versados no idioma engoliram sem mastigar.

É o preço também da convivência com velhas raposas, como José Sarney, que nunca deixou os corredores do poder, lugar que frequenta desde 1955. Não seria agora se abandonaria o osso. Temer, político das sombras desde a década de 60, talvez não esteja acostumado com os holofotes que ficam ligados sobre a presidência como reality show 24 horas. É outro exercício de poder, caro ex-vice-presidente.

O problema se dá em outra ordem. Os ministros não seguem as orientações da presidência. Cada um faz o que quer no relacionamento com a mídia. Na prática, são deputados federais de baixo clero embriagados com a visibilidade repentina. Uma coisa é o blablablá de um parlamentar de pequena relevância. Outra coisa é a enxurrada que o palavrório de um ministro pode provocar.

Não se vê uma cartilha de posições conjuntas e coerentes. Ministros se atrapalham em entrevistas, tagarelam demais e obrigam a Presidência da República a uma operação abafa todos os dias. Quando começarão as sessões de midia training?

O Ministro da Saúde, Ricardo Barros, foi um exemplo de falta de treinamento para lidar com a imprensa. Além de dizer que o SUS precisava diminuir de tamanho, Barros estava mal informado sobre os limites da Constituição Federal a respeito do tema. O equívoco avolumou a atenção sobre ele, que defendeu ainda a fiscalização menos rigorosa sobre planos de saúde. O maior doador de campanha dele é presidente de uma empresa do setor. A imprensa só juntou lé com cré.

O Governo Temer não soube lidar também com a polêmica em torno do Ministério da Cultura. Diante de um argumento pífio, a redução de gastos cortando uma pasta que significa 0,38% das despesas, Temer reforçou o olhar feio de artistas para a quase ausente política pública para a área.

Acuado, o presidente nomeou um diplomata desconhecido fora do Rio de Janeiro e assinou embaixo o erro quando retomou o status de Ministério. Crise que poderia ter sido evitada. Sorte dele que os cientistas não têm a mesma habilidade para a comunicação.

Compreendo que seja difícil estabelecer uma estratégia eficiente de comunicação quando o governo provisório-definitivo é uma colcha de retalhos em nome do palavrão governabilidade. Na prática, qualquer presidente - e Temer não seria diferente porque é cria do modelo - precisa de coalizões para governar. Dilma, salvo a crise econômica, apanhou toda a vida de um Congresso com 28 partidos, clientelista e afundado em corrupção. Os cúmplices traíram o Governo.

Os ministérios de Temer foram distribuídos por critérios político-partidários, em acordos que se mostram cada vez mais transparentes, a cada gravação que cai no colo da imprensa. A negatividade do processo político é inerente às reações de um governo que entrou pela porta dos fundos, pelo menos a parte que embarcou de carona. A outra parte já estava por lá, no lamaçal.

O Governo Temer deveria prever que a fase é de transição. Que a escolha de figuras notórias, e não notáveis, geraria um impacto de difícil controle. Mas optou por assumir risco mediante os interesses em torno da tomada de poder.

O presidente interino foi à TV para pedir para paz no trabalho. Isso não acontecerá tão cedo. Ele não tem carisma tampouco legitimidade, pois está conectado - na visão de parte da opinião pública que queria a saída do PT, mas tolera a corrupção por afinidade ideológica - ao governo anterior. Temer virou alvo para adversários e para os hipócritas.

Parte da imprensa vai bater nele porque é de sua natureza. A turma da bajulação permanecerá por mais algum tempo alimentando a polarização mortadela-coxinha, impeachment-golpe, pouco vale o nome para a cortina de fumaça.

A questão não é essa. A situação seria um pouco melhor se o fogo amigo ficasse sem munição. Além das denúncias de corrupção já sabida, Temer ainda precisa pegar a mangueira para abaixar a chama da arrogância e da vaidade de membros da gangue, convidados por ele para se sentar à mesa. Esperava mais do poeta-presidente.

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