sexta-feira, 19 de julho de 2013

O ato contra Deus


Os médicos estão deslocados. Derrotados politicamente, eles assistiram à dez categorias da área da saúde vibrarem com o veto parcial da presidente Dilma Rousseff ao Ato Médico, depois de 11 anos de tramitação. Os médicos, com perdão da generalização, reforçaram a imagem de arrogantes, pela postura dos conselhos, que optaram por espernear a negociar. A promessa é brigar no Congresso Nacional pela medida. 

As reações são sintomáticas. A doença, identificada como corporativismo extremus, se manifesta também por conduzir os homens de branco ao isolamento. Ao mesmo tempo, os sinais apontam para cegueira social, interpretada pelos adversários como a cicatriz do Complexo de Deus.

Um exemplo foi quando a categoria resolveu ir às ruas para protestar, não pelo Ato Médico, claro, mas contra a proposta de importação de médicos de outros países como Cuba, Portugal e Espanha. Soou patético ver profissionais e estudantes carregando faixas e cartolinas, sem apoio mínimo da população e completamente alienados à pauta pública dos protestos pelo país.

A doença, repito, eleva a miopia sobre o que acontece a sua volta. Os médicos perderam a oportunidade política de atrair à opinião pública quando o Governo fez a proposta de importar colegas. A ideia integra a lista de invencionices mirabolantes da gestão Dilma que, assim como as anteriores, reage por reflexo, sem mexer nas vírgulas que confundem a leitura do país.

Os médicos jogaram no lixo séptico a chance de expor um governo que finge escutar as ruas, enquanto responde por propostas natimortas e inúteis. A categoria embarcou numa dose de remédios pontuais, que pouco ou nada abalam o debate real, urgente, que merece terapia intensiva.

Ninguém entendeu, para variar, os garranchos médicos, que alertavam para as deficiências estruturais do sistema de saúde. Eles se comportaram como crianças birrentas, que batem os pés contra a ausência de doce no almoço, em vez de duvidar da pedagogia da mãe. No caso, de nome Dilma.

Até o momento, o Governo venceu – com doses homeopáticas – o tratamento dos médicos dado às duas questões. A história mostra que quem luta em duas frentes de batalha simultaneamente morre de inanição.

A gritaria médica segue anêmica. Os médicos, em reação febril, misturam e, por conta disso, diluem argumentos, que reforçam o corporativismo como a doença que corrói a categoria. Todos os grupos tendem ao espírito de corpo, raro cortar a própria carne, mas não significa virar as costas para outros problemas nacionais. E muito menos se fechar ao diálogo com outras categorias da saúde, que fornecem suporte nos hospitais e clínicas.

Propor dois anos de dedicação ao SUS para recém-formados, trazer cubanos, espanhóis, portugueses ou alienígenas, fingir que não faltam médicos no país, desviar o termômetro que avaliaria a má formação dos universitários, tudo são velhos sintomas requentados para desinformar os pacientes.

Os pacientes são os que esperam na fila porque não tem dinheiro. Os pacientes somos nós que possuímos planos por conta de nossos empregos e esperamos menos meses por consultas. Os pacientes somos todos que não queremos mais cuidados paliativos de uma estrutura que parece saudável por fora, mas está repleta de tumores em seus órgãos.

Os pacientes sofrem de males reais, assim como os médicos, que infelizmente preferiram inocular em si o corporativismo tipo 3, variação da enfermidade que delega aos representantes a prática política nos corredores do poder, e não da vida dolorosa nos postos de saúde.

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