segunda-feira, 15 de julho de 2013
Jogando pela imagem
A proposta de se cancelar o recesso de julho na Câmara Municipal de Santos é o termômetro ideal para se observar o comportamento dos vereadores. Nada mais sintomático que a ideia tenha nascido na presidência da Casa, hoje nas mãos de Sadao Nakai (PSDB). Afinal, a presidência é o símbolo de todo um grupo, de um modelo de gestão. É o representante político maior de seus colegas, não somente um cargo administrativo.
O projeto de emenda à Lei Orgânica ainda precisa passar pela Comissão Permanente de Justiça, Redação e Legislação Participativa. É parte da dança burocrática e jurídica. Se o projeto chegar ao plenário, poderá ser votado até o final do ano e, claro, a mudança só valeria em 2014.
Na justificativa do vereador Sadao Nakai, a medida – que determina o período de sessões de 1º de fevereiro a 15 de dezembro – serve para moralizar e melhorar a imagem da instituição.
A proposta, além de tentar desenhar um novo rosto para o Poder Legislativo, é requentada. Pela quarta vez, em 20 anos, a Câmara Municipal discute o fim do recesso em julho. Nas ocasiões anteriores, os próprios vereadores mataram a ideia no apagar das luzes. São os velhos métodos que renascem quando a corda aperta no pescoço.
Acabar com o final do recesso também soa como demagogia. É claro que os vereadores – muito bem remunerados, por sinal – deveriam trabalhar também em julho, como qualquer servidor público. Servidor, e não funcionário, preste atenção no termo, caro leitor.
O problema é que as reações parecem tão encenadas quando o projeto. Em enquete feita pelo jornal A Tribuna, 17 dos 21 vereadores foram favoráveis. Apenas Douglas Gonçalves (DEM), Ademir Pestana (PSDB) e Roberto de Jesus (PMDB) disseram ser contrários. Em termos de imagem, poderia acreditar que os três foram corajosos de se virar contra o politicamente correto. Mas, curiosamente, todos recitaram o mesmo mantra.
Adivinhou? Os vereadores afirmam que trabalham demais em julho. Fazendo o quê? Ouvindo a população, analisando requerimentos, participando de audiências públicas, com pequenas variações nas vozes do coral parlamentar. E daí? Como usualmente o faz, a classe política se esforça para transformar obrigação em mérito.
De que adianta mexer no recesso se as atitudes pouco se alteraram? E os vícios tóxicos que permeiam as relações e as alianças políticas? A Câmara realizará mais sessões para distribuir medalhas, para conceder títulos e outras honrarias provincianas? Ou permanecerão vivos certos gabinetes que se vangloriam de serem máquinas de produção de requerimentos?
A Câmara do século 21 se perdeu no século passado. O Legislativo abandonou – salvo exceções individuais – seu papel de fiscalizar a Prefeitura. Vereadores foram cúmplices nas mudanças nocivas que a cidade sofreu nos últimos anos, como especulação imobiliária, problemas ambientais, política de transporte e trânsito. Salvo uma ou outra voz herege, os parlamentares sempre se ajoelharam e disseram amém a todas as canetadas do Paço Municipal.
A Câmara que pretende, pelas razões erradas, extinguir o recesso de julho é a mesma que desdenhou a voz das ruas nos primeiros 10 dias de protestos. O Legislativo só mudou de canoa quando a Prefeitura congelou a tarifa de ônibus e os manifestantes, literalmente, bateram na porta dos vereadores.
Um dos parlamentares de primeira viagem, aliás, questionou porque as pessoas protestavam na cidade, já que não havia ocorrido aumento no preço das passagens. Além de aprender rápido como negar a palavra a quem o elegeu, o vereador demorou – como muitos colegas – a entender que a luta não era por causa de 20 centavos.
O vereador Ademir Pestana (hoje no PSDB, mas que já foi PT) justificou que o recesso auxilia na economia da casa. Vamos falar de apertar o cinto? Por que não voltar a 17 vereadores, em vez de 21? Por que não reduzir o número de assessores? Talvez a conta ficasse mais barata para os moradores da cidade.
A Câmara costuma, como as demais instituições parlamentares, reagir com lentidão aos fatos. Cortar o recesso para ficar bonito na fotografia é sintomático para quem olha o próprio umbigo e suas mesquinharias do poder. Matar o recesso em julho não mudará, acredite presidente, a imagem dos vereadores. É preciso muito mais do que medidas que tentem acalmar a torcida.
Aliás, o presidente da Casa também disse à imprensa que o fim do recesso teria, entre outros objetivos, moralizar o Poder Legislativo. Ele poderia nos informar, então, onde reside a imoralidade?
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