Caro Cascão, escrevo para me
desculpar com você. Usei seu nome em vão. Não cheguei a gritar aos quatro
ventos. Sequer sussurrei com amigos próximos, como fofoca de família. Mas o ato
de pensar em seu nome me deu a sensação de cometer uma injustiça.
Você, Cascão, nunca espalhou sujeira. No máximo, uma
fedentina que afetou os amigos próximos, principalmente o que fala errado. Por
causa do medo de água, te confundi com outro personagem de seu universo, o
Capitão Feio. Ao morar nos esgotos, este vilão obscuro sempre tentou te arrastar
para o caminho da poluição, mas jamais conseguiu por ser contra sua natureza.
Lembrei-me de você como metáfora do que acontece na minha
cidade. Você personificaria o comportamento de centenas de candidatos que, como
o Capitão, emporcalham o cenário de tantas histórias. E o chiqueiro só aumentará
até outubro.
Os “sugismundos” não são criativos. Copiam uns aos outros
como seres da mesma espécie. Começam a invasão lentamente, com os cartazes
lambe-lambe. Misturam-se a shows, ícones religiosos e publicidade em geral.
Tenho saudades de um grupo que, com humor, escrevia
mensagens em cavaletes de candidatos, há quatro anos. Conheci alguns dos
autores que, espirituosos, entendiam sua arte como protesto e reuso destes
objetos que massacram visualmente as esquinas.
Mas a luta deles é inglória. A sujeira, caro amigo,
ganhou tamanho e mobilidade. Os colantes, antes tímidos, agora ocupam todo o
vidro traseiro dos carros, fora as bicicletas. Nomes, números, slogans clichês
e rostos sorridentes se cruzam em um trânsito cada vez mais entupido pela
cultura do automóvel e pela ausência de políticas públicas de transporte.
Cascão, sua aversão ao banho nasceu na mente e nos traços
em papel de teu pai, Maurício de Souza. Marcou a infância de muitos leitores
iniciantes como eu. Mas você soube “crescer” e estender sua presença em novas
tecnologias para alcançar as crianças de hoje. Minha filha brinca com você e o
restante da Turma da Mônica na Internet. Meu filho te assiste em DVD.
Os clones do Capitão Feio também descobriram o mundo
virtual e o transformaram numa versão emporcalhada da realidade concreta. É
chavão, para eles, citar a candidatura de Barack Obama – o presidente dos EUA,
sabe? – como exemplo de sucesso na campanha nas redes sociais. Mas ninguém leu
as estratégias, todos ignoraram o papel da Internet na política e não
entenderam o contexto particular daquele país.
Por conta disso, eles fizeram da tela do computador uma
caçamba de entulho. São os mesmos santinhos que calam as bocas-de-lobo, agora
na versão on-line. Há candidatos que vomitam fotos de si mesmos a cada meia
hora. Quem se julga mais criativo espalha imagens de eventos. Qualquer
acontecimento de rodapé de página é alçado à notícia do ano. Missa, churrasco,
passeio em calçadão; vida ordinária vira sujeira pública virtual.
Sua sujeira, caro amigo, sempre foi parte de você. Mas
apenas de ti. Entre os que poluem a cidade, há até aqueles que se vestem de
verde. De fato, meio ambiente é uma retórica que sensibiliza muita gente, porém
ausente da prática do dia-a-dia. Se você conhecesse minha cidade, veria quanto
as crianças daqui convivem com o cinza do concreto.
Cascão, peço novamente perdão por
pensar em seu nome. Sua vida pode ser suja, mas com o lirismo único das
crianças que, no máximo, tentam fugir do banho. Por isso, você jamais entenderá
até onde poderá chegar o nível de sujeira dos capitães.
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