Marcus Vinicius Batista
A prisão do ator Caio Martinez por policiais militares durante a peça "Blitz - O império nunca dorme" reacendeu o debate sobre censura e liberdade de expressão. Como uma comédia de erros, o episódio nos proporcionou cenas hilárias de pastelão, como equívocos propositais para enganar o público e manter a história sob suspense. O final, aliás, segue indefinido.
A repressão arrepiou a todos. Se até o governador Geraldo Alckmin e o jornal Folha de S.Paulo, em editorial, condenaram a ação dos policiais militares, o temor é mais do que justificável. O autoritarismo está vivo, nos olhando atrás das sombras.
Os policiais militares tomaram uma decisão pelo orgulho ferido. Tentaram ser mais realistas do que a corporação que servem e viraram personagens dos Três Patetas. Foi o humor infantil às avessas, de quem generaliza tudo, não enxerga a segunda camada do texto e reage sem perceber que a crítica institucional os defende, como trabalhadores mal remunerados e sujeitos a todo tipo de violência - não a teatral - no cotidiano.
Parte do público que consumiu o espetáculo de mídia pós-prisão também ficou com o pirulito na boca enquanto recebia tapas na cabeça. Muita gente caiu no conto da carochinha chamado "Agressão aos símbolos nacionais."
A versão foi a tentativa de reviravolta na comédia, dada por quem não quer parecer vilão da história. Na praça, os policiais não falaram em "uso indevido de símbolos nacionais", como aparece no Boletim de Ocorrência registrado no 1º Distrito Policial de Santos.
Lá, o discurso inicial era o som alto. Depois, o "tom" da peça. Nada de bandeira de cabeça para baixo ou outros exageros de fundo cívico, que mais lembram as aulas de Educação Moral e Cívica da ditadura militar. Tristes quem nunca percebeu a catequização do sistema educacional.
A versão que nasceu na delegacia e foi pulverizada pela PM tentou desmoralizar os artistas, criminalizá-los e ganhou eco no coral do bandido bom é bandido morto. A mesma turma que se cala diante dos baixos salários do policiais e silencia de medo quando é parada numa blitz por associar polícia à excesso de violência e corrupção.
A propaganda funcionou! A comédia de erros mudou de rumo e oscilou no maniqueísmo infantil de novela. Dali, brotaram investigações para acalmar os danos políticos. Os PMS deverão pagar pela distorção de leitura de mundo.
Muita gente adepta do "não vi e não gostei" partiu para o achismo imediato que justifica tese anterior - e se encaixa em tudo na vida - para ganhar a conversa. Jamais se coloca no lugar do outro. Até porque, se se colocasse no lugar dos policiais, os entenderia como indivíduos, passíveis de erros, e fruto de um treinamento e de uma rotina que os desumaniza.
A maior piada deste episódio é o não entendimento de que liberdade só existe como ato coletivo e é necessária para criticar, tanto artistas quanto policiais. A história se repete como farsa. Na história, os defensores do autoritarismo só se dão conta de que - cedo ou tarde - a mão de ferro caiu sobre eles quando não podiam mais reclamar ou falar, exceto dizer amém ou "Sim, senhor, senhor."
Até o governador sabe disso.
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