sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Conversa inútil


Marina Silva, Dilma Roussef e Aécio Neves

Os debates na TV entre os principais candidatos à Presidência da República garantem duas certezas: pérolas de humor e a necessidade de se rever, com urgência, um formato que se tornou inútil para o processo eleitoral.

Os debates políticos tornaram-se meros enfeites. São conversas em que sobram ataques pessoais, frases melancólicas e a ausência quase completa de propostas e de programas de governo. Ironicamente, não discutir além das generalizações nos poupa de peças de ficção científica, embora não nos proteja de promessas ocas.

Os debates cometeram suicídio político. Há debates em excesso na TV brasileira. Todos os canais resolveram montar o próprio ringue. Quem tem audiência e prestígio fica para o final da campanha. O SBT chegou ao cúmulo de promover um debate no horário improvável das 17h45.

Os índices de audiência comprovam a ineficácia do formato. Nenhum debate registrou mudanças substanciais de público. Aliás, as pesquisas indicam que os debates pouco alteram as intenções de voto. Pelo contrário, reforçam teses do eleitorado, tanto o engajado quanto o que caiu de paraquedas via controle remoto. As brigas entre os candidatos confirmam o amor e o ódio por eles.

Além disso, os debates viraram um rosário de restrições, por pressões das equipes de campanha. Com o formato engessado, sobrou pouco espaço para manifestações espontâneas. Dois candidatos combinam entre si para atacar um terceiro. Os cidadãos comuns, ao contrário do modelo americano, foram calados e ficaram distantes do processo.

Quem lidera também ficou mais protegido, paradoxalmente. O modelo atual dá margem para ataques, mas expõe o agressor como alguém que abriu mão de propostas em detrimento da briga de rua. Em situações nas quais o líder das pesquisas pode vencer no primeiro turno ou com folga no segundo turno, é muito mais cômodo simplesmente não aparecer na TV. Isso aconteceu, por exemplo, com Lula e com o então prefeito de Santos João Paulo Tavares Papa.

Os eleitores mais saudosistas, neste momento da corrida, se lembram dos primeiros debates, no final da década de 80. Lembram-se de concorrentes como Mário Covas, Ulisses Guimarães, Paulo Maluf, Leonel Brizola, Lula e até Fernando Collor. Sem entrar no mérito das paixões, os primeiros debates eram conduzidos por grupos de veículos de comunicação e aconteciam em quantidade menor. As regras eram mais soltas e davam maior mobilidade aos candidatos. 

Da esquerda para a direita, Paulo Maluf, Mário Covas,
Maria Gabriela (mediadora), Lula, Ronaldo Caiado e
Guilherme Afif Domingos

Os debates presidenciais começaram nos Estados Unidos, em 1960, ainda no tempo da TV preto e branco. Os candidatos eram o republicano Richard Nixon e o democrata John Kennedy. O primeiro debate foi transmitido simultaneamente no rádio e na TV, pela CBS.

O impacto foi curioso. Nixon teria vencido para quem ouviu pelo rádio. Para os telespectadores, o ganhador foi Kennedy, visto como mais bonito, carismático e de voz sedutora. Nixon suava em bicas dentro do estúdio, o que dava a impressão de nervosismo. As reações contraditórias causaram tamanho estrondo que os Estados Unidos ficaram sem debates na TV por 16 anos.

Assisto aos debates por obrigação profissional, e penso que não precisamos ignorá-los. Talvez tenha a esperança de que o circo dê lugar a uma conversa séria. Ou que a palhaçada assuma de vez o lugar no picadeiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário