quinta-feira, 12 de setembro de 2013
A árvore que esconde a floresta
A denúncia nasceu durante reunião do Conselho da Cidade de São Paulo, na semana passada. A voz era de Anderson Lopes Miranda, integrante do Movimento da População em Situação de Rua, da capital. Segundo ele, moradores de rua estariam sendo despejados durante a madrugada, no bairro do Jabaquara. Os responsáveis pela “exportação de gente” seriam funcionários da Prefeitura de Santos.
De acordo com Anderson Miranda, muitos moradores de rua procuraram o movimento para pedir ajuda. A denúncia foi publicada, no último dia 4, na coluna de Sônia Racy, no jornal O Estado de S.Paulo. A secretária de Assistência Social, Rosana Russo negou as acusações e disse que “não exportamos seres humanos”.
É complicado provar as denúncias, assim como é evidente que não se trata de prática inédita. Nos anos 90, a Prefeitura de São Paulo foi acusada de fazer o processo inverso. Eram famosas as kombis que largavam pessoas aos pés da Serra do Mar.
Outros casos aconteceram no Paraná. Na década passada, cidades do interior despejavam andarilhos em Curitiba. Em entrevistas, muitos moradores eram favoráveis à faxina de seres humanos. Não é preciso caminhar muito para ouvir opiniões semelhantes em Santos. Pouco se toca no assunto, pois prevalece a invisibilidade diante do desigual que dorme em papelão.
É difícil romper com uma estrutura viciada. Ações isoladas não garantem mudanças na infraestrutura. É preciso, além de espaços físicos, profissionais bem remunerados, qualificados e com condições de trabalho.
Uma das assistentes sociais, convocada recentemente por conta de concurso público, procurava em seções da própria Secretaria de Assistência Social vaga para um morador de rua. Ele frequenta o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua, o Centro POP, inaugurado no final do primeiro semestre.
Todos os abrigos e albergues estavam lotados. O prefeito Paulo Alexandre Barbosa disse, ao jornal O Estado de S.Paulo, que a cidade dobrou para 400 o número de vagas em abrigos. Mas o município tem cerca de mil moradores nas ruas. Com noites chuvosas e frias, o déficit fica exposto, da mesma forma que as marquises são insuficientes para quem procura um prato quente de sopa.
Esta semana também começou a circular, nas universidades, o recrutamento da FIPE. O anúncio chama estudantes para trabalhar no censo de população de rua. A Prefeitura vai pagar R$ 221 mil à instituição ligada à USP. Seria uma noite de trabalho em outubro, com entrega dos dados em 180 dias. É possível contabilizar uma população, com características nômades, numa noite? Fará diferença se alcançarmos mil moradores ou 830 pessoas, segundo dados considerados defasados pelos próprios operadores sociais?
Embora no papel a administração fale numa comissão de cinco secretarias, o problema da população de rua ainda não é tratado de maneira conjunta. Na prática, é uma árvore que mascara a floresta, carente de políticas públicas, que gritam por um trabalho além do mandato de quatro anos.
Nesta semana, começou a funcionar em Santos uma unidade da Cristolândia, ligada à Igreja Batista. O grupo atua na Cracolândia, em São Paulo. No próximo mês, outra entidade – a Missão Belém – trabalhará também no atendimento aos dependentes químicos.
A Prefeitura trabalha com dados da Unifesp, que indica que 86% dos moradores de rua são dependentes de álcool e outras drogas. Sem discutir a doutrina religiosa destas entidades, é essencial o diálogo e a troca de informações para que todas as ações sejam conectadas a longo prazo. As árvores às margens da floresta agradecem.
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