quinta-feira, 2 de julho de 2015

Em qual Papa acreditar?


O quintal de Eduardo Cunha? 
O deputado federal João Paulo Tavares Papa, quase sempre discreto, ganhou os holofotes por ter votado contra a redução da maioridade penal, ignorando a correnteza indicada pelo PSDB. E permaneceu no foco porque mudou o voto 24 horas depois, no golpe armado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha. 

No tribunal de gritos das redes sociais, Papa reuniu elogios e críticas com corpo de ofensa. Passou de traidor a sujeito coerente e vice-versa. Papa, até o momento, nadava junto com a esquadra de partidos conservadores, dominante na Câmara Federal. Ele seguia com os colegas Beto Mansur e Marcelo Squassoni, demais representantes da Baixada Santista no Congresso Nacional, em votações como terceirização e financiamento empresarial de campanhas eleitorais. Um parênteses: Bruno Covas têm domicílio eleitoral na Capital e sempre foi turista político por estas bandas.

Apenas o tempo e o restante do mandato vão dizer os porquês das duas decisões tomadas pelo ex-prefeito de Santos. Não me arrisco a especular os motivos e tampouco cogito a utopia da convicção ideológica (artigo extinto na política brasileira, salvo os guetos nanicos). No caso de Papa, é preciso paciência, pois seus passos nunca respondem pelo dia de hoje, embora a segunda votação pareça sobrevivência parlamentar.

Afilhado de Oswaldo Justo, Papa aprendeu que a política é a arte de trabalhar em silêncio, sem jogar palavras ao vento. Como aluno de muito bom nível, ele compreendeu que política eficiente é aquela que possui projeto de poder e que os holofotes da mídia devem ser domados, com doses homeopáticas de vaidade.

Apesar de terem perfis diferentes, Papa e Márcio França talvez sejam os peixes grandes que melhor digeriram a dinâmica do aquário político-eleitoral. Papa foi o maior vencedor da eleição municipal em 2012, na região. Adiou a construção de um sucessor – Sérgio Aquino – para confirmar a vitória do sucessor que desejava, de fato.

Foi a cartada para assegurar a própria eleição, dois anos depois. Neste tempo, sumiu por três meses, reapareceu com a saída do PMDB e filiação ao PSDB, manteve-se nas sombras numa diretoria da Sabesp e só retomou o caminho da luz ao se candidatar à deputado federal. Isso sem receber farpas por conta da crise hídrica, na qual a Sabesp representa um dos papéis principais.

A visibilidade controversa por causa da votação em Brasília é um acidente de percurso, perfeita e infelizmente contornável. Acompanho a carreira política de Papa desde a superintendência regional da Sabesp, no início da década de 90. Ele é um político de passos lentos, porém seguros.

Papa se encaixou no perfil de gerente, desejado pelos eleitores a partir do século 21. Nunca perdeu uma eleição e soube deixar outros políticos, que poderiam atrapalhá-lo, no acostamento. Muitos dos problemas atuais da cidade, como trânsito, esquizofrenia imobiliária e população de rua, nasceram ou se agravaram em sua gestão, mas Papa nunca foi associado a eles. E jamais teve o nome aliado à má gestão financeira ou corrupção.

Três fatores vão desviar, em breve, a navalha do pescoço do deputado federal. Seriam golpes de sorte? O primeiro, em caráter nacional, é o comportamento do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha. Em mais um golpe, o déspota do Legislativo pautou o mesmo projeto com maquiagem, o que tirou de cena a votação anterior, em urgentes 24 horas.

Depois, na região, Papa poderá sofrer um pouco mais com a choradeira concentrada em redes sociais, que não altera o cotidiano da rua que se veste conservadora para se fingir progressista. E, como terceira variável, o eleitorado sofre de amnésia, ainda mais sobre o Poder Legislativo, onde a desinformação é convidada vip da casa.

Todo político precisa de sorte? Talvez. Não sei em qual Papa acreditar, mas os políticos que sobrevivem sabem que informação, planejamento e projeto de poder são o coquetel da vitória nas urnas. Tanto para o deputado que votou SIM como para o deputado que votou NÃO, prefiro esta última hipótese.

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