O filme publicitário de O Boticário sobre o Dia dos Namorados é um exemplo de criatividade. Não se trata do conteúdo, da narrativa em si, que mostra diversas pessoas se preparando para encontrar seus namorados e namoradas, pessoas de diversas opções sexuais, de idades diferentes.
O filme de O Boticário entrou para a História da Publicidade brasileira pelo circo, e não pelo número de um dos artistas. O filme em si, aliás, é convencional, sutil, discreto até. Nem beijo há! O Boticário somente escapou do clichê tradicional de casais heterossexuais, que representam a família feliz, aquela que depois vai gerar um casal de filhos na publicidade de margarina.
O Boticário não revirou valores, prática coerente com o papel da Publicidade. Esta linguagem sempre se baseia em um cenário idealizado, de venda ilusória de felicidade e de liberdade. Os valores nascem de percepções do público, e não o contrário. Por essas e outras, a Publicidade pouco se arrisca diante de certas certezas, como o Dia dos Namorados.
A grande sacada de O Boticário foi perceber antes uma mudança gradual de comportamento em diversos setores da sociedade. Legislação, mídia, representantes políticos, movimentos sociais, apareceram diversos sinais de que a homofobia (e seus sintomas doentios) e a liberdade sexual ganharam outros olhares nos últimos anos.
A intolerância, um exercício de ignorância, misturado à virulência com pitadas de falta de inteligência, caiu no pulo do gato. As reações foram truculentas e previsíveis. As manifestações de homofobia, apoiadas no moralismo religioso, saltaram como veias alérgicas. Os preconceituosos de Bíblia nas mãos – desconfio que leram, mas não entenderam – fizeram exatamente aquilo que a empresa de cosméticos desejava.
A informação deixou de ser necessária há décadas na Publicidade, salvo certos segmentos como o varejo. Na Era da Imagem, a ordem é envolvimento emocional. Mais do que dados sobre a marca e o produto, a obviedade é fazer com que o consumidor traga as mercadorias para dentro de casa. Defenda-as. Integre-as às próprias lembranças. Chame-as pelo nome a ponto de considerá-las parentes. E, acima de tudo, rejeite a concorrência. Como a Coca-Cola e a campanha pela refeição em família!
O Boticário conseguiu o que queria. Não tinha como medir o tamanho da tempestade, mas poderia prevê-la. Em primeiro lugar, visibilidade para a marca. Depois, o apoio incondicional de consumidores, que elevaram a imagem da empresa ao defendê-la contra os inquisidores medievais. E, por tudo isso, os cifrões deverão se multiplicar em sua conta bancária, no mínimo, até dia 12 de junho. Comprar no Boticário, para os ingênuos, virou ato político.
Os intolerantes, agarrados à escuridão da própria visão de mundo e ao individualismo, são os melhores servos pela incapacidade de se colocar no lugar do outro. São os melhores servos porque tagarelam como matracas as palavras de um líder religioso repleto de interesses político-econômicos. São os melhores servos porque dão visibilidade a uma empresa, que lucrará como poucas vezes em sua história.
Homofóbicos, essa semana seu Deus chamado Mercado se perfumou com O Boticário. Sentiu a fragrância? Feliz Dia dos Namorados!
Sensacional! O que me preocupa (e talvez eu seja parte dos ingênuos) é que, agora, existe o meme "Raio Boticarizador", que gayzifica uma imagem, uma figura, uma pessoa. E, com isso (não só com isso, é apenas um indício, óbvio, o mundo não são os memes do Facebook), O Boticário pode ficar estigmatizado como uma marca gay. E apenas gay. É meu medo. Não que seja um pejorativo. Mas é que eu adoro as colônias Dimitri, Egeo, assim como sempre usei Oops,Quasar e Aqua Brasilis. E agora, será que eu sou gay?
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