Independentemente de quem será o próximo presidente da República, a campanha definiu o maior derrotado: nós, os eleitores. Antes que se vista o manto das vítimas, o gosto amargo do veneno nos aponta, na verdade, como cúmplices.
Somos coautores porque aceitamos os mesmos dois partidos disputando o poder há duas décadas. Não cobramos por renovação, nem dentro destas siglas, quanto mais na política no sentido mais amplo. Engolimos os mesmos discursos, nascidos dos mesmos lábios, apenas com trocas de cargos.
Somos cúmplices porque toleramos um nível de campanha que cheira a esgoto. Ficamos calados diante da ausência de propostas, de programas tão mal explicados quanto inconsistentes, da nulidade de um projeto de país para longo prazo. Assistimos aos debates como programas de humor ou como ringue.
Caímos na armadilha de uma campanha eleitoral marcada pelo marketing rasteiro e virulento. E reproduzimos a estratégia no cotidiano, como seres dominados que desconhecem o cárcere em que vivem. Levamos ao pé da letra a ideia de que democracia funciona pelo conflito, e não pelo diálogo.
A busca pelo eco entre os eleitores virou, para mim, quase uma obsessão. Padarias, pontos de ônibus, locais de trabalho, redes sociais (aliás, tão mal usadas que nunca entendemos as lições de Barack Obama. Talvez porque sejamos assim, truculentos).
De todos com quem conversei (ou das conversas que testemunhei), nenhum deles foi capaz de debater política e eleições sem descambar para as críticas ou ofensas ao candidato adversário. Tenho que admitir, claro, que alguns se esforçaram para colocar na pauta a agenda do candidato escolhido, mas aí faltavam argumentos diante do vazio do presidenciável.
Usamos como muleta a imprensa, instituição deformada pelos próprios interesses. Salvo exceções, mais individuais do que empresariais, testemunhamos um jornalismo panfletário, que oscilou entre a assessoria publicitária gratuita e o denuncismo sem evidências.
Coniventes, os eleitores atenderam ao chamado da superficialidade, quando não passaram das capas e das primeiras páginas. Poucos questionaram o tom hostil da cobertura, os erros de informação, a ausência de provas. Pelo contrário. A imprensa era a chave da credibilidade para um discurso anti-PT ou anti-PSDB, conforme o olhar do freguês.
Qualquer eleição é um festival de mentiras, de distorções estatísticas, de destruição de reputações e construção de heróis com pés de barro. O problema mora na ingenuidade infantil de assinar cheques em branco, movido pelo ódio de ver um ou outro perder nas urnas.
É a imaturidade de quem esquece que sempre haverá um vencedor, que, a partir de 2015, governará com um Congresso Nacional composto por 28 partidos. O novo presidente ganhará, de presente, sem ser o dono, um armazém de secos e molhados. E comprar, por lá, custará bem caro, mas a ser pago com dinheiro alheio.
Perdemos esta eleição. Os protestos de junho de 2013, que abriram o sorriso do otimismo, foram inúteis. As promessas de mudança por parte do governo foram ocas. A irritação dos opositores era jogo de cena. Em ambos os casos, fingir que se mude para manter a paralisia. Um crime imperdoável cuja sentença já saiu para os eleitores-cúmplices: pena de quatro anos, em regime fechado. A prisão? Um território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados.