sexta-feira, 28 de março de 2014
Um pedaço de museu
Com a aproximação da Copa do Mundo, o patriotismo brasileiro, centrado nos esportes e – eventualmente – na cultura, se sobressai como regra, o que implica na necessidade do culto aos clichês. Expressões como “melhor futebol do mundo”, “pátria de chuteiras”, “time de guerreiros”, “200 milhões de corações na ponta da chuteira” viram mantras para parte da mídia, interessada – é claro – nos dividendos comerciais da competição.
De carona, a classe política se aproveita da conjuntura favorável para torrar dinheiro em propaganda e adaptar o discurso do “ame-o ou deixe-o”. Em Santos, descontando as expectativas de casa cheia – e de lucros exorbitantes - por conta das seleções do México e da Costa Rica, a promessa de gol de placa é o Museu Pelé. O lugar virou o camisa 10 – com o perdão do trocadilho - de mais uma onda de progresso vestido de especulação.
O Museu Pelé é, de fato, um símbolo desta época de Copa do Mundo. Simboliza como o comportamento da classe política se repete em blefes, independentemente de qual seleção partidária os jogadores defendem por baixo dos ternos e das gravatas.
A estratégia de jogo é sempre sujeita a adaptações, ainda que as mudanças sejam de improviso. A palavra planejamento, por exemplo, não aparece no vocabulário. As obras do Museu Pelé estão atrasadas dois anos. O custo dobrou: de R$ 20 milhões para R$ 40 milhões. O anúncio aconteceu em 2007, mesmo ano em que o Brasil foi escolhido como sede.
Além disso, o museu não será inaugurado completo. Quando assumiu a Prefeitura, Paulo Alexandre Barbosa disse que a obra estaria pronta antes da Copa. O discurso foi reforçado até janeiro deste ano, minimizando as dúvidas colocadas pelos jornalistas.
Na semana passada, o secretário municipal de Turismo, Luiz Dias Guimarães, afirmou que o Museu Pelé não abriria as portas com todos os setores concluídos. Em outras palavras, o museu será inaugurado por volta de 9 de junho, com maquiagem definitiva ou de oportunidade. Até agora, a Prefeitura não bateu o martelo sobre quando cortará a fita.
A questão não é somente política. É matemática. Quando faltavam 104 dias para a abertura da Copa, o Diário Oficial de Santos publicou o cronograma de serviços do museu. A Eletrowal teria 120 dias para implantar a entrada de energia. A Viabiliza Engenharia e Construções, 100 dias para instalar pisos, tampos e bancadas de granito. Já a P.D da Silva Rocha, 90 dias para instalar os pisos de mármore. E a HJI Instalações, também 90 dias para colocar o forro metálico. Diante do histórico de atrasos, basta fazer as contas.
O acervo, que precisa ser organizado conforme normas museológicas, engrossa a lista de dificuldades. Fora a organização das peças, viabilizar o museu é um processo que implica também na contratação e capacitação de pessoas, envolvendo toda a hierarquia, mais projetos paralelos de fundo educacional.
Nos intervalos da obra, as promessas em campo. O secretário estadual de Turismo, Claudio Valverde, prevê que o Museu será o ponto mais visitado do Estado de São Paulo, superando o Zoológico da Capital. É como chutar quem será o campeão da Copa, em 13 de julho.
O Museu Pelé vai entrar no ritmo carnavalesco que contamina a Copa do Mundo. A tática é previsível. Festa, sorrisos, juras de amor à pátria, políticos em torno do rei (se ele aparecer!). Pagaremos a conta após o apito final, por um espaço que precisará de reparos tão logo nasça para o público. Um golaço, só que contra.
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