sexta-feira, 11 de setembro de 2015

O biquíni e a política




Marcus Vinicius Batista

Uma rotatória transformou-se em vilã do trânsito, em Santos. E uma pichação tornou o VLT uma vítima do vandalismo. Duas situações, em tese, distintas, mas que nos indicam como o umbigo pode ser o ponto mais importante do corpo.

Na rotatória inaugurada no canal 7, dois acidentes em dois dias fizeram com que a nova sinalização fosse responsabilizada por muitos motoristas. Não tenho competência para avaliar a (im)perícia dos condutores envolvidos, mas é possível refletir sobre dois comportamentos comuns, seja no trânsito, seja no entendimento da política pública de transporte.

O primeiro deles é a ausência de educação para conviver com outros seres humanos motorizados. Testemunhamos viúvas de Ayrton Senna, artistas do xingamento, mágicos capazes de tagarelar ao celular e pilotar ao mesmo tempo. E todos, por coincidência, creem ter razão sempre, como fregueses das vias públicas. Um patinete no tapete da sala.

Os alunos mal educados desconhecem que a rotatória funciona em endereços onde há cortesia, responsabilidade social, noção dos riscos que se corre quando se senta dentro de um carro. Não há pontuação para quem sai primeiro da rotatória. Só há a preferencial para quem entra nela antes.

Muitos motoristas, politizados até a página 3 da cartilha do Detran, choram e batem o pé, com queixas de que faltam semáforos no local. É a criança mimada, que sempre transfere os deveres. No caso, o hábito de ser tutelado pelo Estado para se fazer o mínimo como cidadão. Vamos encher a cidade de semáforos para reduzir acidentes, conter a sanha selvagem dos (outros) ases ao volante. Aí o trânsito fica mais carregado, como no Canal 4, e os motoristas pedem a volta da liberdade de ir e vir (desde que eu primeiro).

Por trás da polêmica de final de semana, a ausência de um debate consistente sobre o cenário do trânsito municipal. Queixas sobre congestionamentos, soluções paliativas e localizadas, por vezes revertidas, e ninguém se atreve a conversar (ou planejar) sobre a qualidade do transporte público e a mentalidade de endeusar e sonhar com o consumo do transporte individual.

A pichação de vagões do VLT ganhou ares de terrorismo. Vândalos destruíram o patrimônio público e aumentaram os gastos com o veículo. Não carreguem nas tintas que decoram os vagões. Se a pichação é um ponto negativo, o VLT está sempre no mesmo ponto de parada. Parado!

Ao contrário de reportagens ufanistas que indicam uma cidade colorida com a obra, o cotidiano retrata a morte do planejamento urbano, a inexistência de um projeto definitivo, a condução paquidérmica dos trabalhos. O trecho da avenida Francisco Glicério, entre a avenida Conselheiro Nébias e o canal 3, já foi pista de atletismo para estudantes de Educação Física. Hoje, é estacionamento de carros, alguns talvez dos mesmos universitários.

O VLT nos foi vendido como um projeto-símbolo da metropolização fictícia, cujo cenário são nove cidades. Depois, foi reduzido a um ferrorama de origem espanhola entre Santos e São Vicente. O trem de brinquedo vai para frente e para trás, até porque as curvas seguem indefinidas pela política, enquanto o dinheiro alheio escorre pelos trilhos, como brincadeira de criança.

Nessas horas, me lembro do jornalista Fernando Gabeira e sua definição de biquíni. Para ele, biquíni é – sarcasticamente - a roupa que “mostra tudo, mas esconde o essencial.” Na política, acidentes e pichação vestem roupas novas para velhos problemas, os acessórios que camuflam o que interessa.

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