A Universidade de São Paulo se transformou no centro da educação brasileira. Das socialites aos estudantes, dos políticos aos jornalistas, dos com-ar-condicionado aos sem-nada, muitos resolveram incluir a USP na agenda, ainda que não a conheçam, ainda que não a dimensionem dentro do sistema educacional brasileiro.
Com apoio de parte da imprensa, praticante do jornalismo “copia e cola”, pronta para vomitar as versões mais conservadoras ou elitistas, a ocupação da reitoria por universitários se transformou em um circo com uma lona maior do que o esperado. Mas o resultado nos conduziu ao mesmo endereço: a esquina onde a desinformação e o preconceito se encontram.
Estudantes e policiais militares serviram como canais que carregam sintomas de uma sociedade doente, cega como grupo e manca como consciência coletiva. Os estudantes mal são ouvidos. Ouvir com orelhas tortas não é escutar. As premissas indicam que todos ali são maconheiros e filhinhos de papai, frutos de um sistema que privilegia o topo da pirâmide em detrimento da base sócio-econômica.
É claro que muitos universitários se lambuzam com leituras teóricas em diagonal, o que os leva a crer na possibilidade de promover uma revolução sem contexto, como se estivessem congelados na década de 60. No entanto, isso não condena os estudantes que compreendem a natureza ética e social de seus papéis e, acima de tudo, percebem o quanto falta senso de coletividade no meio acadêmico, por vezes afogado em mesquinharias científicas, de costas para o mundo além dos muros e das grades.
Soa irresponsável associar como questão absoluta a vida universitária e o tráfico de drogas. O consumo não representa prerrogativa ou exclusividade do meio universitário. O assunto é questão de saúde pública e permeia todos os segmentos sociais. Associar vida estudantil à compra e venda de drogas lícitas e ilícitas é de um reducionismo ofensivo, máscara de cínicos.
Outro sintoma de uma sociedade fora do eixo é perceber como se distorce o papel e os limites da Polícia Militar. Via de regra, a sociedade teme a polícia e a associa a comportamentos irregulares. Só que, quando precisa de alguém para fazer a faxina indesejável, o mesmo grupo corre para bajular a instituição policial. Na ocupação da reitoria da USP, parte da sociedade – da boca miúda aos gritos histéricos – defendeu que os policiais batessem nos universitários. Que abusassem da autoridade e da violência, tão criticadas na mesa de chá e vibrantes na pele do Capitão Nascimento.
O autoritarismo e a intolerância se misturam com a patrulha do politicamente correto, escravo do pensamento único. A tradução é varrer dos olhos quem pensa ou se manifesta fora do padrão. É marginalizar o alheio, sem direito à defesa ou à voz de reivindicação.
A ocupação do prédio da reitoria da USP, somada aos conflitos com a PM, além dos protestos da última semana importam menos diante de um cenário onde prevalecem a ausência de diálogo e de poder de escuta. Vence o prazer de ouvir os próprios grunhidos de truculência, mesmo que desinformados, superficiais e fragmentados. Neste sentido, PM é guarda de patrimônio, jamais de gente, independentemente da conta bancária.
Alguém se lembrou de aproveitar o calor dos fatos e discutir o sistema universitário, a violência na USP ou a educação brasileira, excludente e formadora de castas? São enredos que não animam a sala de jantar.