Uma vez por semana, me aproximo do que considero o modelo ideal de educação, com pouca burocracia e livre de pormenores que glorificam e sacramentam o pequeno poder. Dou aulas, desde o ano passado, na Universidade Aberta da Terceira Idade (UATI), projeto que se renova há duas décadas na Universidade Católica de Santos.
Uma tarde por semana, aprendo com mais de 40 alunos, 90% mulheres, que dividem comigo suas experiências, histórias, exemplos, erros, dúvidas e angústias. Até as certezas e verdades absolutas, por vezes colocadas em xeque pelo colega ao lado, servem de ensinamento.
As aulas flertam com a pureza e com o idealismo da educação. Não há provas. Não existem notas. Todos estão livres do estigma da reprovação. Faltas também não reprovam. O conteúdo é flexível, conforme os interesses dos alunos a partir de um diálogo com o professor. Conhecimento é reflexão, jamais escravo do utilitarismo ou da mecânica robotizada de apertar botões.
As reações dos alunos, com média de idade acima dos 65 anos, é imediata. Se não concordam com algum exemplo ou conceito, expõem suas opiniões sem impor argumentos como dogma. Não temem a patrulha alheia, comum ao sistema educacional, que esmaga a palavra dissonante e cristaliza a falsa autoridade absoluta do professor. Se eles gostam do que ouviram, são acolhedores e agradecem pela aula recebida. Muitos alunos, inclusive, prolongam o diálogo pelos corredores da universidade.
Ali, consigo perceber uma luta involuntária, mas eficiente, contra dois dos maiores males que assolam o meio acadêmico: a vaidade e a soberba. Ambas resultam na contínua confirmação de teses e opiniões, postura que consiste na surdez diante da voz do outro. O interesse maior é se deliciar com o som das próprias palavras.
São estudantes que resolveram se sentar diante de professores - alguns poderiam ser filhos - para compartilhar e usufruir de novas visões que os levem a compreender e se proteger do mundo que, acelerado, teima em querer atropelá-los. São pessoas profundamente interessadas na vida, que por vezes é arrancada deles como se o corpo enfraquecido paralisasse a mente, impossibilitada de seguir adiante.
As terças-feiras, infelizmente, também se transformaram em dias de melancolia, como as contradições que permeiam o caminho de todos nós, seres tão pretensiosos quanto frágeis. No último mês, duas alunas deixaram o curso. Ambas faleceram, uma delas no Dia das Mães.
Eram mulheres de posições fortes, dispostas a abraçar a reflexão e o debate. À moda delas, sabiam reconhecer um ponto de vista discordante, ainda que relutassem em aceitar o argumento alheio. Mas jamais faziam da crítica um exercício cruel da intolerância.
Dar aulas às terças-feiras à tarde me tornou diferente. Se melhor professor, não sei. Não houve premeditação dos envolvidos, mas a cumplicidade se constrói a cada semana a partir do interesse pelo outro e, principalmente, pelo interesse conjunto pela vida humana. É a minha forma de desejar a educação, para todas as circunstâncias, endereços e culturas.